Título: O FILTRO DUPLO
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Fonte: O Globo, 24/01/2005, Panorama Político, p. 2
A reforma ministerial ficou para depois da eleição do presidente da Câmara, em 14 de fevereiro, mas o presidente Lula tem deixado circular a informação de que um de seus critérios para a escolha de novos auxiliares será não nomear os que tenham planos eleitorais para 2006. Teriam que ser novamente substituídos, por força da lei, dentro de 14 meses, em abril daquele ano.
Esta condição pode servir a Lula tanto para barrar o caminho de pretendentes como para justificar a saída de alguns dos atuais ministros, sem parecer que foram demitidos por insuficiência de desempenho ou por debilidade política.
Em relação aos atuais ministros, sabe-se que Lula tem dificuldades para afastar alguns, sobretudo os petistas mais amigos, como Olívio Dutra, das Cidades, ou Humberto Costa, da Saúde. A primeira pasta é cobiçada pelo PMDB. Na segunda, não tem queixas de Humberto mas gostaria de ver mais coisas acontecerem. Se assumirem que são candidatos, podem facilitar a vida de Lula e sair com a reputação administrativa preservada. Mas como Lula tem muitos ministros políticos, e quase todos devem disputar cargos eletivos, se tivesse que se livrar agora de todos os que serão candidatos, faria uma limpa. O próprio ministro José Dirceu, que coordena o governo, não vai querer ficar sem mandato.
Logo, a adoção deste critério pode funcionar apenas como um filtro facilitador. Lá adiante, novas substituições acabarão sendo necessárias, surgindo o que Lula tem dito que acha inconveniente: ministros que vão durar nove meses, como os que Fernando Henrique teve quando disputou a reeleição.
O critério pode lhe ser útil também para evitar nomeações indesejadas. Do PMDB, por exemplo, poderá exigir indicações mais técnicas, alegando que os deputados irão fatalmente disputar a reeleição. Ou então, optar por senadores que ainda tenham mais quatro anos de mandato. Os dois ministros atuais serão candidatos em 2006. Eunício Oliveira, das Comunicações, é deputado, e o mandato de senador de Amir Lando, da Previdência, vai terminar.
Outro caso é o da senadora Roseana Sarney, por cuja nomeação trabalham o PMDB governista, o líder petista Aloizio Mercadante, e os ministros Dirceu e Aldo Rebelo. Mas ela deve ser candidata ao governo do Maranhão em 2006, o que pode ser um empecilho.
Mas tudo isso são deduções ou informações esparsas recolhidas pelos que convivem com Lula. Pois desta vez ele está muito reservado ao falar do assunto, limitando-se às conversas institucionais, como a que teve com os peemedebistas José Sarney, Renan Calheiros e José Borba na quinta-feira passada. Mais ouviu do que falou. E o que falou foi, basicamente, que a reforma virá depois do desfecho da tumultuada sucessão na Câmara.