Título: FIM DO PESADELO
Autor:
Fonte: O Globo, 26/01/2005, Opinião, p. 6

Depois de dois anos, parece finalmente ter chegado ao fim o cerceamento ideológico do trabalho da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária. O processo começou no início do governo Lula, quando o presidente da Embrapa por ele nomeado, Clayton Campanhola, já em seu discurso de posse anunciou que passaria a dar ênfase à agricultura familiar, em detrimento do agronegócio ¿ uma estranha atribuição de prioridades para uma instituição devotada ao trabalho científico. E que aliás nunca desprezara a agricultura familiar.

Seguiu-se um período de crescente interferência nas pesquisas e nas nomeações de técnicos e chefes, sob influência do sindicato dos servidores da empresa, o Sinpaf. A perda, como não poderia deixar de ser, foi da ciência: de 39 patentes em 2002, no ano passado a Embrapa registrou apenas 13 ¿ mas empregou um assessor da presidência encarregado exclusivamente de cuidar do programa Fome Zero.

Nos dois anos que durou esse pesadelo, foi posto de lado o agronegócio, responsável por safras recordes e pela maior parcela dos superávits da balança comercial, com mais de 40% das exportações brasileiras, e cujo sucesso decorre exatamente da competência das pesquisas da Embrapa. Nem é por outro motivo que a ONU chega a prever para breve a transformação do Brasil no maior produtor de alimentos do mundo.

O Sinpaf queixa-se agora do que chama de ¿direitização¿ da Embrapa, mas a verdade é que ciência e tecnologia não têm cor ideológica. Criar sementes de soja capazes de germinar nos cerrados não é uma decisão de política partidária: é o resultado de uma longa e trabalhosa linha de pesquisa ¿ e, por sinal, uma das façanhas da Embrapa que fizeram do agronegócio o grande motor da nossa economia.

Ao autorizar a nomeação de pesquisadores de prestígio na área científica para substituir a direção da Embrapa, o presidente Lula fez uma opção pela racionalidade, que nada tem a ver com orientação ideológica. Tomou a decisão de pôr fim ao pesadelo que era não só dos cientistas mas ¿ pela importância crítica do seu trabalho para a economia brasileira ¿ do próprio país.