Título: Sem ser candidato, aiatolá xiita é a figura mais importante da eleição
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Fonte: O Globo, 27/01/2005, O Mundo, p. 31

A figura mais influente nas eleições iraquianas é um clérigo de aparência frágil, que vive isolado, nunca aparece em público e sequer é candidato. Seu rosto com barba branca está em incontáveis cartazes da campanha eleitoral. Desde a queda de Saddam Hussein, nenhum outro iraquiano tem tido tanta influência sobre o povo quanto o grande aiatolá Ali al-Sistani.

Principal voz da corrente moderada no país, Sistani vive recluso na cidade sagrada de Najaf. Embora seja representante de uma poderosa escola xiita que rejeita o poder político para clérigos, ele forçou os EUA a antecipar a transição política, exigindo eleições, depois de a maioria xiita passar décadas alijada do poder no Iraque de Saddam Hussein.

Governos temem aproximação do Irã

Além de apoiar a promessa americana de democracia, desafiando a minoria sunita, Sistani enfrenta um desafio entre os xiitas: o clérigo radical Moqtada al-Sadr, que rejeita os EUA e já liderou duas rebeliões no país. Ambas só tiveram fim depois de sua intervenção. Numa delas, ele deixou Londres, onde se recuperava de uma cirurgia, para voltar ao Iraque e obter um acordo de paz. Era a primeira vez em muitos anos que Sistani, de 73 anos, deixara Najaf.

Embora tenha evitado um confronto com os EUA, Sistani se recusou a se encontrar com Paul Bremer, americano que administrou o Iraque antes da posse do governo interino. Bremer subestimou a influência do aiatolá e foi obrigado a rever seus planos de transição depois de dezenas de milhares de iraquianos tomarem as ruas, em 2003, apoiando o pedido de eleições antecipadas feito por Sistani.

No Iraque, a hora é dos xiitas. A oportunidade é histórica e o peso demográfico está a seu favor. Mas a eleição pode se tornar um presente envenenado se seus líderes não conseguirem assegurar o respeito de sunitas e outras minorias. Depois de três décadas marginalizados, a conquista de poder desperta receios dentro e fora do país. A insurgência leva ao temor de uma guerra civil, mas também está em jogo o futuro dos xiitas em outros países árabes, cujos governos temem que xiitas iraquianos declarem um Estado islâmico e se aliem ao Irã.

¿ O pior resultado seria um novo governo dominado pelos que apóiam o Irã ¿ admitiu em recente entrevista o rei Abdullah II, da Jordânia.