Título: A única arma
Autor:
Fonte: O Globo, 29/01/2005, Nossa Opinião, p. 6

Os defensores de um Brasil em que cada cidadão seria um miliciano armado e perenemente em pé de guerra baseiam seus argumentos numa premissa falsa.

Para esses armamentistas equivocados, é como se diariamente duas facções se enfrentassem num gigantesco campo de batalha. De um lado estaria o exército das pessoas de bem, defendendo heroicamente a família, a propriedade, a vida civilizada. Do outro, as forças do mal ferozmente empenhadas em assaltar, roubar, tomar à força, insultar ¿ em benefício de criminosos que se locupletam dos gigantescos lucros de suas atividades ilícitas. De acordo com essa visão deturpada, no meio da eterna luta de vida e morte travada nos quatro cantos do país vem o governo federal e desarma os cidadãos honestos, reduzindo-os à impotência diante do inimigo cada vez mais arrogante e implacável.

Infelizmente essa situação caricatural pode estar mais próxima da realidade do que parece. Não entra na cabeça dos adversários do programa de desarmamento que o grande inimigo comum são as armas de fogo, estejam nas mãos de bandidos, onde servem a objetivos escusos e são mortíferas; ou em poder de civis honestos mas despreparados, onde oferecem proteção ilusória e são igualmente letais.

Em vez de pressionar o governo para desistir do programa, o que se deve fazer é cobrar do Estado um aparelho de segurança eficaz. Esta é a arma constitucional com que se protege a vida e tudo aquilo que faz dum aglomerado de pessoas uma sociedade humana, e dum pedaço de terra um país soberano e civilizado.