Título: CARGA DEMAIS
Autor:
Fonte: O Globo, 30/01/2005, Opinião, p. 6
A conjuntura mundial continua a favorecer uma alta de preços de alguns insumos importantes para a indústria, como os metais e os que têm origem no petróleo. Nesse contexto, o Banco Central previu na última ata do Comitê de Política Monetária (Copom) a manutenção de juros muito altos para evitar que a inflação no Brasil fuja das metas. Juros altos, se estendidos por vários meses, deixam seqüelas para a economia difíceis de ser superadas. Dessa forma, para que a política monetária não fique sobrecarregada, o governo deveria estar acionando outros instrumentos de que dispõe para atenuar as pressões inflacionárias.
Uma elevação de carga tributária que impacte fortemente os custos e o capital de giro das empresas é inoportuna na situação atual, pois adicionará mais uma fonte de pressão sobre os preços. No entanto, em face do crescimento das despesas do setor público, as autoridades econômicas se renderam mais uma vez à tentação de buscar aumento de arrecadação mudando regras na tributação, ao apagar das luzes de 2004 ¿ com a edição de uma medida provisória que os especialistas, jocosamente, sugerem datá-la num fictício ¿32 de dezembro¿.
A medida provisória não só ampliou a base de cálculo de impostos e contribuições incidentes sobre prestadores de serviços, como jogou estilhaços sobre efeitos contábeis da variação do câmbio e ainda atingiu a agropecuária. Tudo isso a propósito de compensar uma modesta correção na tabela do Imposto de Renda das pessoas físicas.
Tal qual ocorreu em 2004, quando as mudanças feitas no cálculo do PIS e da Cofins ¿ supostamente para remover uma aberração do sistema ¿ redundaram em espantoso aumento da carga tributária (a ponto de comprometer o bom andamento das atividades econômicas no início do ano), a medida provisória em questão terá efeito semelhante em 2005, se o Congresso vier a aprová-la. Aliás, o aumento da carga em 2004 acaba de ser confirmado pelo Tesouro.
No ano passado, os parlamentares tiveram de fazer várias alterações na Cofins, porque o próprio governo reconheceu algumas das distorções que a contribuição estava criando. Agora, o Congresso pode se antecipar a essa iniciativa, derrubando a MP.