Título: Álcool combustível do Brasil para o mundo
Autor: Luciana Rodrigues
Fonte: O Globo, 30/01/2005, Economia, p. 38

Alta do petróleo e exigências ambientais do Protocolo de Kioto devem elevar consumo mundial em 70% até 2010

A disparada nos preços do petróleo e as preocupações ambientais dos países ricos se tornaram um bom negócio para o Brasil. Maior produtor da tecnologia mais antiga e eficiente de combustível renovável do mundo ¿ o etanol ¿ o país viu suas exportações triplicarem no ano passado, quando, pela primeira vez, vendeu para o exterior o álcool carburante. Até então, o Brasil exportava só o tipo industrial. Ao todo, foram US$433 milhões e 2,3 bilhões de litros, dos quais 60% tiveram como destino motores de automóveis de países como EUA, Índia, Japão e Suécia.

Também não é para menos: em 2004, os preços do petróleo subiram 30%. E, no próximo dia 16, entra em vigor o Protocolo de Kioto. Assinado por 180 países, o tratado internacional prevê que as nações industrializadas ¿ das quais só os EUA e a Austrália não são signatários ¿ reduzam em 5,2% suas emissões poluentes até 2012.

Segundo projeções da consultoria americana F.O. Licht¿s, a demanda mundial por etanol deve crescer 70% até 2010, dos atuais 35 bilhões de litros para 60 bilhões. O Brasil é o maior fornecedor, consumidor e exportador ¿ com mais de 40% do mercado global ¿ e também o único capaz de ampliar, de forma competitiva, sua produção. O litro de etanol brasileiro tem custo de produção de US$0,21, contra US$0,33 do americano e US$0,56 do europeu.

¿ No mundo inteiro, o álcool brasileiro é visto com admiração e apreensão ¿ resume Anfred Szwarc, consultor da União da Agroindústria Canavieira de São Paulo (Única).

Índia, Suécia e Japão já usam etanol como combustível

Ele explica que muitos países hesitam em introduzir o álcool em sua matriz energética porque temem ficar dependentes do Brasil. Mesmo assim, Índia, Japão, Suécia e Tailândia já começam a usar o combustível.

Para lidar com essa restrição, governo e iniciativa privada estão atacando em várias frentes. Uma das estratégias, explica Ângelo Bressan Filho, diretor do Departamento do Açúcar e do Álcool do Ministério da Agricultura, é oferecer contratos de longo prazo aos compradores. O Japão, por exemplo, quer financiar projetos em solo brasileiro para seu abastecimento.

O Brasil também tenta incentivar outros países a produzirem álcool, lembra Szwarc, da Única. É o caso de Colômbia e Peru, que podem se tornar fornecedores para a Ásia graças à sua saída para o Pacífico. As parcerias tecnológicas, diz Szwarc, são outra alternativa.

Brasil dribla sobretaxa americana via Caribe

O diretor técnico da Única, Antônio de Pádua Rodrigues, lembra que os produtores brasileiros vão investir US$3 bilhões nos próximos cinco anos em 40 novos projetos, que vão desde a plantação até a construção de destilarias. Nos últimos cinco anos, a produção de álcool cresceu a um ritmo de 10% anuais. E pelo menos dois grupos brasileiros vão fincar o pé no exterior já em 2005, de olho no mercado dos EUA.

A Crystalsev, em parceria com a gigante americana Cargill, vai construir uma unidade em El Salvador. E a Coimex vai montar uma destilaria na Jamaica, com a estatal Petrojam. A empresa comprará álcool hidratado brasileiro, que, depois de desidratado, será revendido como tipo anidro para os EUA.

O gerente da Divisão de Álcool da Coimex, Nélson Ostanello, explica que os EUA aplicam uma sobretaxa de US$140 por cada mil litros de álcool importado. Mas têm um acordo especial com países de Caribe e América Central, para comprar até 900 milhões de litros sem sobretaxa.