Título: Estrela sob pressão
Autor: Fernanda Medeiros
Fonte: O Globo, 01/02/2005, Economia, p. 19

A Estrela, maior fabricante nacional de brinquedos, teve os negócios com suas ações suspensos ontem na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) por causa de dois pedidos de falência apresentados à Justiça na última sexta-feira por fornecedores. As ações foram ajuizadas na 2 Vara de Justiça de Itapira, no interior paulista, pela Gráfica Suprema Embalagens e pela Cartonagem Jauense, que pertencem ao mesmo dono. As empresas afirmam ter faturas, vencidas em outubro e novembro, que não foram pagas.

No início da tarde de ontem a Estrela enviou um comunicado à Bovespa, no qual afirma que os pedidos de falência somam R$ 700 mil e referem-se a débitos já renegociados. Com isso, suas ações voltaram ao pregão. O estrago, porém, estava feito.

¿ Os fornecedores acabaram causando um grande estrago à imagem da Estrela com os pedidos de falência. O barulho foi muito maior do que a quantia devida ¿ disse o presidente da Associação Brasileira dos Fabricantes de Brinquedos (Abrinq), Synésio Batista.

Ele admitiu, entretanto, que o setor passa por um processo de endividamento crescente. A Estrela, por exemplo, que detém 30% das vendas do setor no país, que atingiram R$ 850 milhões no ano passado, acumulou um prejuízo de R$ 23,255 milhões de janeiro a setembro de 2004, valor 152% acima das perdas registradas no mesmo período de 2003.

Advogado: ações são para forçar acerto

Os vilões dessa situação, segundo o presidente da Abrinq, são o subfaturamento dos brinquedos importados, a pirataria e o contrabando, que roubam importantes fatias de mercado dos fabricantes.

¿ Registramos crescimento anual de 6% nos últimos cinco anos, mas isso não é suficiente. As dificuldades são muitas. Mesmo com algumas medidas do governo, não tem como barrar a invasão dos importados e do contrabando ¿ queixa-se Synésio.

Foram os importados que levaram a Estrela à sua primeira grande crise, em 1991, quando o então presidente, Fernando Collor, abriu o mercado brasileiro e os brinquedos vindos de China e Coréia do Sul invadiram o país com preços muito abaixo dos nacionais. Três anos mais tarde, quando ainda se recuperava do primeiro abalo, o governo Fernando Henrique Cardoso reduziu as alíquotas de importação. Essa medida, combinada à valorização do real frente ao dólar, fizeram com que a Estrela perdesse os mercados para os quais ainda exportava seus produtos.

¿ É por isso que afirmo com convicção que este pedido de falência não significa nada. A Estrela não está a beira do caos ¿ diz o presidente da Abrinq.

Para o advogado Paulo Bekig, da Planner Corretora de Valores, a ação das gráficas foi precipitada, já que uma simples ação de cobrança serviria para forçar um acerto.

¿ Normalmente, a Justiça tem-se manifestado contrária a esse tipo de pedido. Não há motivos para pedir a falência da Estrela ¿ diz Bekig. ¿ A empresa tem prejuízos, mas tem dinheiro em caixa e expectativa de faturamento. Além disso, há a possibilidade de pedir empréstimos. Foi uma forma drástica de fazer pressão e tentar um acordo.

Os advogados das empresas que entraram com os pedidos de falência contra a Estrela disseram que só irão se manifestar amanhã. Para Bekig, da Planner, independentemente da decisão da 2 Vara de Itapira, a Estrela deve entrar nos próximos dias com uma ação de perdas e danos contra seus fornecedores.

¿ Já está tudo resolvido, entramos em um acordo com o cliente e em breve eles devem desistir do processo. Foi só um susto ¿ comentou um executivo da Estrela que não quis se identificar.

Por causa do pedido de falência, as ações preferenciais (sem direito a voto) da Estrela caíram 4,16% na Bovespa ontem. Os papéis, que têm pouca liquidez (facilidade de compra e venda) e sequer chegam a ser negociados diariamente na bolsa, terminaram o dia cotados a R$ 2,30. Ao todo, ontem só foram realizados 12 negócios com os papéis da Estrela. Com a queda de ontem, as ações da companhia acumulam perdas de 11,54% este ano. Mas, em 2004, registraram alta de 42,86%.