Título: Uma Babel onde as tribos se encontram
Autor: Bruno Porto
Fonte: O Globo, 01/02/2005, Megazine, p. 8

Um sujeito se aproxima de outro e pergunta: ¿ Posso fazer uma roda de poesia aqui?

O outro não só responde que sim como diz que quer participar. Eles começam a declamar poemas e logo uma terceira pessoa junta-se aos dois, tocando bongô. Minutos depois, uma pequena multidão de hippies, hare krishnas, neometaleiros e fãs de hip-hop está ouvindo atentamente os três. A cena, ocorrida na semana passada, dá idéia do clima do Acampamento Intercontinental da Juventude, que existe desde o primeiro Fórum, em 2001, e que para muitos é a principal atração do evento.

Localizado no Parque Maurício Sirotsky Sobrinho, uma imensa área verde às margens do Rio Guaíba, ele é uma espécie de minicidade. Nesta última edição, montaram barracas no lugar mais de 20 mil jovens do mundo todo. Por causa do clima festivo, o acampamento pode parecer, a princípio, uma Woodstock gaúcha. Olhando com mais cuidado, porém, dá para perceber que não é bem assim. O acampamento é marcado pela pluralidade, mas está longe de ser caótico.

Ele é separado em sete centros, subdivididos em ¿bairros¿, como o Libélula, e ¿avenidas¿, como a Chico Mendes. As dezenas de atividades (debates, oficinas, palestras, shows, performances) que acontecem em 28 espaços são anunciadas por uma rádio do acampamento. Há até uma creche para os acampados deixarem os filhos.

Quase toda a área é limpa: de tempos em tempos grupos de jovens catam lixo do chão. Os acampados também se organizam para tomar conta das barracas, pois várias delas já foram alvo de furto. É o lado ripongo, no entanto, o que mais chama a atenção no acampamento. Nele todos tomam banho em chuveiros ao ar livre, a maioria de biquíni ou sunga ¿ e alguns poucos pelados mesmo. Nas entradas do acampamento, tem gente vendendo de camisetas politizadas a bijuterias.

A maioria dos participantes parece ter saído de Mauá, com seus cabelões e camisetas com a foto clássica de Che Guevara. Dividindo o acampamento com eles, estavam punks, rappers, góticos, clubbers e grunges, entre outros. Algumas meninas, com visual meio patricinha, pareciam ter saído do Shopping da Gávea. A diversidade também podia ser constatada nas comidas e na música. Enquanto um grupo tocava forró, outro, a poucos metros de distância, curtia hip-hop. Vegetarianos conviveram sem problemas com gaúchos que diariamente faziam churrasco do lado da barraca.

O clima festivo não agradou a todo mundo. Gabriel da Silva, que esteve em todos os fóruns, reclamou do fato de muita gente só estar ali para se divertir.

¿ Um pouco de festa é normal, mas estão exagerando ¿ diz ele, que tem 22 anos.

E olha que a reclamação foi antes do fim de semana, quando o acampamento ficou mais social do que nunca...