Título: ESTUDO: UNIÃO PUXA CARGA TRIBUTÁRIA RECORDE
Autor:
Fonte: O Globo, 02/02/2005, Economia, p. 21

A carga tributária brasileira voltou a crescer em 2004, atingindo o recorde de 36,76% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de todas as riquezas geradas pelo país ao longo de um ano), e seu acréscimo foi resultado, sobretudo, de impostos e contribuições do governo federal. Essas são as principais conclusões de um estudo dos economistas José Roberto Afonso, Amir Khair e Erika Amorim Araujo. Pelas suas estimativas, a União foi responsável por 70% do aumento da carga tributária entre 2003, quando foi de 35,23% do PIB, e 2004.

Só a Cofins respondeu por um acréscimo de 45% no peso dos impostos na economia. No fim de 2003, o governo mudou as regras para cobrança da Cofins ¿ as alíquotas aumentaram para alguns setores, mas deixaram de ser cumulativas ¿ e, na época, garantiu que não haveria impacto na arrecadação.

O economista José Roberto Afonso, ex-superintendente de Assuntos Fiscais do BNDES e hoje consultor técnico da liderança do PSDB na Câmara, destaca que a União elevou os tributos que não são compartilhados com estados e municípios. Na prática, o governo federal não repartiu os frutos desse aumento de tributação.

Cai parcela de estados e municípios nas receitas

No seu estudo, Afonso analisou também as receitas tributárias de cada esfera do governo. Ou seja, o quanto cada um dispõe de recursos depois da arrecadação e das transferências constitucionais. Em 2003, a União ficou com 58,1% das receitas tributárias, fatia que cresceu para 58,9% no ano passado. Enquanto isso, os estados viram sua parcela no bolo das receitas cair de 25,1% para 24,6% e, nos municípios, a redução foi de 16,8% para 16,5%.

¿ A participação federal foi muito alta. Está se invertendo tudo o que foi feito na última reforma fiscal, na Constituição de 1988 ¿ afirma Afonso.

O estudo mostra ainda que, no ano passado, a carga tributária de 36,76% do PIB foi a mais elevada desde 1947. A arrecadação somou R$650 bilhões, um acréscimo de R$99,8 bilhões, sem descontar a inflação, em relação a 2003. Afonso compara esses números com a expansão do PIB brasileiro: em 2004, o país gerou R$206,8 bilhões a mais de riquezas, em termos nominais, do que em 2003. Mas quase metade disso ¿ os R$99,8 bilhões de aumento de arrecadação ¿ foi parar nas mãos do governo.

¿ A economia teve um desempenho espetacular em 2004, com o maior crescimento dos últimos dez anos. Mas metade do aumento da renda nacional foi apropriada pela máquina do governo ¿ diz o economista.

Ele ressalta que, muitas vezes, a maior tributação leva os empresários a reajustarem seus preços. Para conter a inflação, o Banco Central, por sua vez, eleva os juros, o que aumenta o custo da dívida pública e força o governo a subir ainda mais a arrecadação.

¿ É o cachorro mordendo o próprio rabo ¿ resume.

Receita diz que só calcula carga após resultado do PIB

Afonso sugere medidas emergenciais para desonerar os investimentos, como a criação de créditos tributários para a compra de máquinas e equipamentos e para a construção civil.

Consultada sobre o estudo, a Receita Federal informou que só calcula a carga tributária anual após a divulgação do PIB pelo IBGE. Os resultados preliminares do valor do PIB serão apresentados em 31 de março. Afonso, por sua vez, explica que usou em sua metodologia estimativas para o PIB feitas pela Secretaria do Tesouro Nacional ¿ subordinada ao Ministério da Fazenda, assim como é a Receita ¿ no seu relatório de contas fiscais de dezembro.