Título: Ataque ambientalista
Autor: Evandro Ébolui e Soraya Aggege
Fonte: O Globo, 05/02/2005, O País, p. 03

Decisão do governo de fazer concessões a madeireiros é duramente criticada por ONGs

O governo foi duramente criticado ontem por representantes de organizações ambientalistas, como o Greenpeace e o WWF, por ceder à pressão dos madeireiros do Pará e liberar planos de manejo que estavam suspensos pelo Ibama. Os ambientalistas acusam o governo de ter cedido à chantagem dos madeireiros e comparam o episódio ao embate dos transgênicos, disputa na qual a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, também está levando a pior.

O coordenador da Campanha Amazônia do Greenpeace, Paulo Adário, disse que o governo cedeu às chantagens dos madeireiros:

- Ao fazer acordo com os madeireiros, o governo beneficiou um pequeno grupo de infratores, assim como fez com os transgênicos.

Já o deputado Sarney Filho (PV-MA), ex-ministro do Meio Ambiente, acusou o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de "não agüentar pressão" e ceder sempre quando há protestos contra as medidas que adota na área ambiental:

- O governo cedeu a empresários que atuam ao arrepio da lei, que não pagam impostos, exploram mão-de-obra escrava e que estão destruindo um ecossistema da maior floresta tropical do mundo. É inaceitável!

Sarney Filho afirmou que o governo deveria endurecer com os madeireiros e enviar tropas do Exército à região para conter manifestações como o bloqueio de estradas e rios e a destruição de pontes.

- O que está ocorrendo lá é desobediência civil, organizada por gente que quer ganhar na marra e com métodos escusos. O governo deveria criar um força-tarefa e enviar o Exército para pôr ordem na casa - disse o deputado.

Para ambientalista, boas intenções ficam no papel

O coordenador do programa amazônico da WWF (Fundo Mundial para a Natureza) no Brasil, Luís Meneses, avalia que o Ministério do Meio Ambiente está cheio de boas intenções mas não tem conseguido operacionalizar medidas em defesa da Floresta Amazônica.

- Entre o tentar do governo e o conseguir há uma lacuna- disse.

Meneses considera que as terras amazônicas, a maior parte griladas da União, teriam que ser públicas e liberadas sob concessão para usos específicos.

- Mas o que se vê são três andares de títulos nos cartórios, com uma grande corrupção. É preciso haver uma mudança de paradigma- considerou.

Segundo Meneses, o governo radicalizou com os planos de manejo e agora colhe as conseqüências, tendo que recuar:

- É preciso uma reforma ampla, que vá da questão ambiental ao acesso à terra. Não pode haver medidas bruscas. O recuo foi natural. Tomara que usem como forma de apressar o processo de regularização das terras.

Movimentos sociais discordam da medida

O recuo do governo irritou também os representantes de movimentos sociais, dos Lula tenta reaproximar seu governo.

- O governo está esquizofrênico, com fragmentação de personalidade. Os atos ficam a cada dia mais distantes do discurso. Na prática, está agindo em prol de minorias, como madeireiros e grileiros, sem ouvir os movimentos - disse Marcelo Furtado, diretor de campanhas do Greenpeace, que participou do Fórum Social Mundial, em Porto Alegre.

-Não houve ainda um debate qualificado com o governo. O que está acontecendo agora é lamentável, inclusive por causa da grilagem. Foi um grande retrocesso esse acordo - disse a coordenadora do Grupo de Trabalho das Florestas no Fórum, Adriana Ramos, do Instituto Sócio Ambiental (ISA).

O Greenpeace afirmou ainda que a promessa de acelerar a autorização para exploração de madeira em áreas de assentamento vai facilitar a ação dos madeireiros, que poderão fraudar os pedidos para legalizar madeira extraída em regiões proibidas.

Em nota, a ONG lembrou que, em 27 de janeiro, o gerente-executivo do Ibama no Pará, Marcílio Monteiro, afirmara que o órgão não iria "ceder à chantagem" dos madeireiros. Mas após reunião com madeireiros, o ministério anunciou a reavaliação desses planos para receber uma autorização provisória de extração em 2005, mesmo sem serem donos das terras.