Título: POTÊNCIA, MAS SEM INFLUÊNCIA
Autor: Rubens Barbosa
Fonte: O Globo, 08/02/2005, Opinião, p. 6

O National Intelligence Council (NIC), órgão de pesquisa e de formulação estratégica da CIA, deu recentemente publicidade a dois interessantes trabalhos sobre as tendências globais e os cenários para o mundo em 2020.

No documento "Tendências Globais 2015", o NIC selecionou alguns fatores que determinarão a conformação do mundo até 2020: demografia, recursos naturais e meio ambiente, ciência e tecnologia, economia global e globalização, governança nacional e internacional, futuros conflitos e o papel das Nações Unidas.

O outro trabalho "Panorama Global em 2020", de certa forma, complementa o primeiro estudo e mostra como a ordem internacional está passando por profundas transformações e como em 2020 o mundo será marcadamente diferente do de 2004.

As transformações que ocorrerem serão influenciadas pela globalização e suas contradições, pelas modificações no panorama geopolítico com o aparecimento de novas potências, pelos novos desafios à governança e por um sentido mais difundido de insegurança.

As principais conclusões do trabalho, no tocante às transformações do panorama geopolítico com a emergência de novas potências, são bastante reveladoras e colocam o Brasil em uma posição de relevo.

* Os EUA continuarão a ser em 2020 a nação mais poderosa do mundo, embora cedendo gradualmente parcelas de poder, que será menor do que o detido hoje. Apesar das crescentes dificuldades econômicas internas e de segurança externa nos EUA, o mundo unipolar liderado por Washington continuará a existir nos próximos 15 anos.

* A Ásia será a região mais dinâmica nas primeiras duas décadas do século XXI. China e Índia emergirão como os novos atores globais no campo político e econômico, como resultado da combinação do elevado e sustentado crescimento econômico, da expansão da capacidade militar, da promoção ativa de tecnologia de ponta e da grande população. A China ultrapassará a todos em termos de gasto com a defesa, perdendo apenas para os EUA, e deverá transformar-se numa potência militar de primeira classe.

* A Europa, com uma dramática redução populacional, deverá perder posição relativa e se distanciar das duas novas potências emergentes, embora não se possa descontar a possibilidade de uma Europa mais forte e unida e de um Japão mais ativo internacionalmente.

* O Brasil, a África do Sul, a Indonésia e a Rússia poderão emergir como importantes potências econômicas, mas não terão a mesma influência política global da China e da Índia e, por isso, terão um impacto geopolítico mais limitado e dificilmente terão condições de se transformar em motores de crescimento econômico nas respectivas regiões.

* O aparecimento desses países poderá reforçar a atuação da China e da Índia e permitir a formação de novos alinhamentos internacionais, como foi o caso do G-20 no contexto da OMC.

O exame desses documentos aponta para uma situação bastante negativa para a America Latina. No sumário introdutório do "Panorama para 2020", a região não é nem mencionada, o que não deixa de significar uma forte indicação da sua desimportância para os rumos da política e da economia mundiais, na percepção da comunidade de tomadores de decisão em Washington.

A perspectiva é a de que a região continuará a perder influência nas questões mundiais e ficará crescentemente marginalizada e distante dos países desenvolvidos.

O Brasil e o Chile aparecem como exceções nesse cenário negativo por suas crescentes vinculações com os pólos dinâmicos da economia mundial, em especial com a Ásia. O Brasil é visto como um Estado-chave, por sua democracia vibrante, economia diversificada, população empreendedora e instituições econômicas sólidas e seu desempenho exercerá uma profunda influência na região.

A perspectiva de o Brasil emergir como uma potência econômica global até 2020 torna urgente a discussão e a definição, a partir da próxima eleição presidencial em 2006, de uma agenda para o futuro e de uma sólida parceria entre governo e setor privado para assegurar a efetiva defesa do interesse nacional em um mundo em mudança.