Título: PROJETO DE AUTONOMIA DO BC DEVE INCLUIR CONCEITO DE CONTRATO DE GESTÃO
Autor: Enio Vieira
Fonte: O Globo, 08/02/2005, Economia, p. 14

Mais comentada das prioridades da agenda microeconômica do Ministério da Fazenda, o projeto de lei de autonomia operacional do Banco Central (BC) deverá incluir - assim pretende o governo - o conceito de contrato de gestão. A intenção é estender à autoridade monetária uma proposta que o PT defende para as agências reguladoras (dos setores de energia, telefonia e petróleo). Nos contratos, são definidas metas e eventuais penalidades para o descumprimento de objetivos, que poderia ser até uma perda de cargo no caso da diretoria do BC.

Atualmente, a Câmara dos Deputados discute o projeto de reformulação das agências com a criação de contratos de gestão. Se aprovada, a autonomia será o ponto mais importante das mudanças feitas no BC nos últimos anos - que não foram poucas.

O Banco Central completou 40 anos no último dia 31 de dezembro. Criado no formato de independência - que durou de 1964 a 1967 e foi extinto por Delfim Netto, então ministro da Fazenda - a instituição perdeu atividades para o Tesouro Nacional a partir de 1999, como a emissão de títulos públicos. Este ano, a responsabilidade pelos lançamentos de bônus no exterior também foi transferida para o Tesouro, que, de 20 de janeiro para cá, já realizou duas emissões.

Banco Central passará a ter menos atribuições

A fiscalização e regulamentação dos fundos de investimentos foram para a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) em 2002. O momento decisivo do BC foi o regime de metas de inflação e a adoção do câmbio flutuante. A atual diretoria - sobretudo Afonso Bevilaqua, diretor de Política Econômica, e Eduardo Loyo, diretor de estudos especiais - vem desenhando o novo formato da instituição, em que o banco cuidará basicamente da meta de inflação e da regulação do sistema financeiro brasileiro. Ficam ainda sob o guarda-chuva da autoridade monetária setores como consórcios e liquidação de bancos quebrados.

O argumento desta redução no número de responsabilidades é que os agentes econômicos terão mais clareza de que apenas o BC orienta os rumos da economia com a taxa de juros. Por este raciocínio, o BC autônomo traria menor custo ao trazer maior confiabilidade e resultaria na necessidade de manter taxas de juros altas por períodos mais curtos de tempo no combate à inflação.

A autonomia do BC no Brasil deve prever ainda mandatos para os oitos diretores e o diretor-presidente, não coincidentes com as eleições presidenciais. Em tese, a nova regra evitaria a interferência política com a chegada de um novo governo.

Modelos variam em outros países

Na Nova Zelândia, diretores do BC ganham bônus se atingirem metas

Apesar de semelhantes, os modelos de autonomia variam em cada país. Na Inglaterra, por exemplo, são 16 diretores com mandatos de quatro anos renováveis. Este é um caso citado pelos petistas porque a autonomia operacional ocorreu com a chegada do Partido Trabalhista de Tony Blair ao poder, após vários anos da ortodoxia dos conservadores (Margaret Thatcher e seu sucessor John Mayor).

Havia um temor de guinada na economia pelos trabalhistas, o que não se concretizou, mesmo caso da subida do PT ao poder. Desde 1997, o BC inglês deixou de fazer a fiscalização e a regulação dos bancos locais, que passou a outra entidade. No Brasil, essa tarefa continuaria no Banco Central.

Outro exemplo lembrado é o da Nova Zelândia, sobretudo em relação aos incentivos e às punições para o cumprimento de meta de inflação. Os diretores do BC neozelandês recebem bônus caso atinjam as metas.

A premiação pode parecer estranha aos bancos centrais. Mas existem arranjos mais curiosos de BCs. Na Suíça e no Japão, o setor privado tem ações do banco central. Também há o formato independência total. Em 1964, o então ministro da Fazenda Roberto Campos pensou no Federal Reserve (Fed) americano para conceber o BC brasileiro. O Fed se divide em 12 instituições regionais e fixa suas próprias metas, sem divulgá-las ao público. Mas, se errar feio e a economia desandar, a diretoria pode ser mandada para casa pelo Congresso.

O Chile também tem um BC independente para definição de suas próprias metas e dirigido por um conselho de cinco membros indicados pelo governo, com aprovação do Senado, para mandatos de dez anos. No caso chileno, a demissão só ocorre por faltas graves, como improbidade.