Título: No Suriname, Lula critica elite brasileira
Autor: Chico Otávio
Fonte: O Globo, 17/02/2005, O País, p. 14

Pouco antes de retornar ao Brasil, onde duas crises o aguardavam, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve um dia de estadista no encerramento de sua viagem de três dias a Venezuela, Guiana e Suriname. Vestido com um xale e um colar tradicionais do interior da África, simbolizando as boas-vindas aos visitantes, Lula foi a estrela da 16ª Reunião de Cúpula dos chefes de estado do Caribe, em Paramaribo, capital do Suriname. No discurso, defendeu a integração dos países caribenhos à recém-criada Comunidade Sul-Americana de Nações, pediu apoio ao processo de reconstrução do Haiti e criticou as relações históricas do Brasil com países desenvolvidos, em prejuízo dos pobres.

-- Embora o país tenha conquistado a Independência em 1822, a cabeça política da elite brasileira esteve voltada o tempo todo aos países ricos. Ao assumir, resolvemos priorizar a relação com os países em desenvolvimento.

Assistido por dirigentes de nove países, Lula disse que ele próprio, como dirigente sindical entre 1975 a 1980, fez diversas viagens à Europa, ao Canadá e aos Estados Unidos, mas nunca esteve em encontros da América do Sul, Caribe e África. O presidente alertou que, só com a unidade, os países em desenvolvimento serão capazes de mudar as relações de forças internacionais e construir uma nova geografia econômica e social.

-- Aprendi uma lição quando era dirigente sindical: a unidade do trabalhador possibilitava ter mais conquistas no enfrentamento do empresariado. Na política entre estados, a coisa não é diferente.

Durante os três dias de viagem, Lula tentou evitar que as crises provocadas pela derrota na Câmara e o assassinato da freira Dorothy Stang afetassem a agenda de sua viagem, mas acabou antecipando em seis horas o retorno ao Brasil. Na chegada ao Suriname, na noite de anteontem, negou-se a falar sobre a morte da religiosa. O ministro do Turismo, Walfrido Mares Guia, explicou que o presidente pretendia acompanhar pessoalmente a situação no Pará. A decisão de voltar, segundo ele, foi tomada anteontem quando Lula foi informado de mais duas mortes no Pará.

-- Lula está triste com a violência e quer assumir uma decisão forte sobre o assunto.

(*) Por falta de disponibilidade de vôo comercial, o repórter viajou entre Georgetown (Guiana) e Paramaribo (Suriname) em avião da FAB, na comitiva presidencial