Título: O mais longo aperto monetário
Autor: Aguinaldo Novo/Ênio Vieira/Patricia Eloy
Fonte: O Globo, 17/02/2005, Economia, p. 23

Ao confirmar as expectativas do mercado e, por unanimidade, elevar os juros básicos da economia pelo sexto mês consecutivo ontem, o Banco Central (BC) inaugurou a mais longa série de alta da Selic nos dez anos de existência do Comitê de Política Monetária (Copom), instituído em 1995 para disciplinar a política monetária do país. Dando a curta explicação que se repete há meses, o BC subiu a taxa em 0,5 ponto percentual - de 18,25% para 18,75% ao ano, o nível mais alto desde os 19% de outubro de 2003.

A primeira alta do atual ciclo de ajuste dos juros foi em setembro do ano passado, de 16% para 16,25% ao ano. As outras duas maiores seqüências de aperto monetário continuado duraram cinco meses, seguidas de um período de manutenção da taxa. Em 2001, o BC elevou a Selic de 15,75%, em março, para 19% ao ano em julho devido ao racionamento de energia. Na crise financeira durante as eleições presidenciais de 2002, o Copom aumentou os juros para 21% ao ano em outubro e interrompeu o movimento com 26,5% ao ano em fevereiro de 2003, já no governo Lula.

Desta vez, os analistas esperam que o ciclo de elevações termine em março, na sétima alta, desta vez de 0,25 ponto percentual (para 19% ao ano).

Economista critica gastos públicos

Para Sérgio Werlang, ex-diretor de Política Monetária do BC e atual diretor-executivo do Banco Itaú, já deveria ocorrido uma pausa no ciclo de altas, para avaliar o impacto dos aumentos recentes sobre a economia:

- Com a nova alta esperada para a reunião do mês que vem e uma política fiscal ainda expansionista, em descompasso com a política monetária, fica comprometido o crescimento esperado de 4% para este ano. A expansão deve ficar em torno de 3%.

Heron do Carmo, presidente do Conselho Regional de Economia de São Paulo (Corecon-SP), também reclama da falta de sintonia entre política fiscal e monetária:

- A política monetária está enxugando gelo. O governo continua gastando muito, o que faz com que os juros tenham que subir além da conta para que se tenha algum resultado efetivo na economia. Mas não dá para a política monetária agir sozinha. Isso só gera mais ônus social e a economia não deve crescer além de 3% a 3,5% este ano. E o problema não é só este ano: já compromete o crescimento a longo prazo.

As explicações para a decisão de ontem do BC serão apresentadas na ata da reunião, na próxima quinta-feira. O fato de as expectativas de inflação para este ano estarem há meses acima dos 5,1% estabelecidos como meta pela autoridade monetária tem sido apontado como motivo para a constante alta da Selic. A nota divulgada após a reunião do Copom repetiu a mesma frase que vem sendo publicada desde novembro de 2004:

"Dando prosseguimento ao processo de ajuste da taxa de juros básica iniciado na reunião de setembro de 2004, o Copom decidiu, por unanimidade, elevar a taxa Selic para 18,75% ao ano, sem viés". Como não se indicou uma tendência (viés), os juros ficarão estáveis até a próxima reunião, nos dias 15 e 16 de março.

Empresários e sindicalistas dizem que a medida desestimula investimentos e a geração de empregos. Segundo o presidente da Federação do Comércio de São Paulo, Abram Szajman, aumenta também a dívida do governo, o que acaba levando a mais aumentos de impostos para arcar com a despesa.

Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), os juros ultrapassaram "os limites do sustentável".

- Se a decisão de elevar as taxas se estender para o segundo trimestre, a atividade e o ritmo de crescimento ficarão comprometidos - disse o presidente da entidade, Armando Monteiro Neto.

O diretor-executivo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), Julio de Almeida, chamou a atenção para o fato de já existir redução no ritmo da atividade econômica neste início de 2005:

- Se o BC queria desacelerar um pouco, conseguiu. Agora, está na hora de tirar o pé do freio.

Já o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, disse que faltou "sensibilidade" ao Copom, no momento em que "todo o empresariado e a sociedade se mobilizam de forma incisiva contra o golpe tributário representado pela medida provisória 232" (que elevou o IR para os prestadores de serviços).

O presidente da Federação do Comércio do Estado do Rio, Orlando Diniz, afirmou que as micro e pequenas empresas, que começam a se recuperar, sofrerão de maneira mais intensa os efeitos da alta da Selic.

Enquanto o Copom estava reunido em Brasília, a Força Sindical organizava uma manifestação em frente ao prédio do BC em São Paulo. No início da noite, quando a nova Selic foi anunciada, houve uma queima de fogos para "comemorar" a decisão.

- É preocupante presenciar sucessivas altas nos juros que estão nos levando para tempos tenebrosos - disse o presidente da central, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho.