Título: KIOTO ENTRA EM VIGOR COM PROTESTOS ANTI-EUA
Autor: Bernardo de la Peña/Maiá Menezes
Fonte: O Globo, 17/02/2005, Ciência e Vida, p. 31

O Tratado de Kioto, o plano global para reduzir os gases associados ao aquecimento global, entrou ontem em vigor sob uma onda mundial de críticas aos Estados Unidos. Os americanos, os maiores poluidores do mundo, se recusam a fazer cortes em suas emissões, alegando que trariam sérios prejuízos a sua economia.

Ambientalistas realizaram protestos contra os EUA em numerosos países. No Brasil, houve manifestações no Rio e em São Paulo. O acordo entrou oficialmente em vigor numa cerimônia em Kioto, cidade japonesa onde foi negociado em 1997.

- As mudanças climáticas são um problema global e precisam de uma resposta global séria e urgente. Eu conclamo a comunidade internacional a ser corajosa, a aderir ao acordo e cumpri-lo. Não há tempo a perder - declarou o secretário-geral da ONU, Kofi Annan.

Defensores do acordo, ratificado por 141 países, dizem que ele tem importância política, embora reconheçam que terá poucos efeitos práticos. Ele é visto como um tímido primeiro passo no corte de gases poluentes. Ao todo, 35 países industrializados - Rússia, integrantes da União Européia e Japão entre eles - se comprometeram a cumprir Kioto. EUA e Austrália estão de fora.

Muitos especialistas temem que se as emissões de gases-estufa (principalmente CO2, metano e óxido de nitrogênio) continuarem a crescer, a temperatura do planeta também se elevará. Em conseqüência, poderão ocorrer mudanças sérias, como a elevação do nível do mar, a intensificação de secas e inundações, e a redução das terras disponíveis para a produção de alimentos.

Especialistas dizem que a entrada em vigor de Kioto marcará também o aumento das pressões sobre os países em desenvolvimento. Brasil, China e Índia têm sido exortados a fazer cortes. O Brasil sofre ainda pressão devido às queimadas na Amazônia. Os países em desenvolvimento, entretanto, estão isentos da cota de redução e por isso podem vender suas reduções (em forma de créditos de carbono) a nações que se comprometeram a cumprir metas. Estima-se que este novo mercado internacional deva movimentar US$2 bilhões em 2005.

Brasil pode captar até R$300 milhões com carbono

E o Brasil pode lucrar com isso, já que as indústrias nacionais poderão vender às companhias com sede em países desenvolvidos títulos que representam as suas taxas de redução na emissão de poluentes. Para isso, precisam apenas desenvolver projetos que reduzam sua emissão de gases.

Cada tonelada de carbono a menos jogada na atmosfera, chega a valer US$5. A cada ano, 6 bilhões de toneladas são lançadas no meio ambiente.

- Temos dois projetos já aprovados e podemos ter ao longo do ano cerca de 40 apreciados. Se tivermos entre 25 e 30 projetos aprovados, poderíamos captar algo entre R$150 milhões e R$300 milhões - explicou o ministro da Ciência e Tecnologia, Eduardo Campos.

Depois do lançamento, no ano passado, do Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE) pela Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) e pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, o governo do Rio anunciou ontem parceria com a Bolsa de Valores do Rio com o mesmo fim. Em São Paulo, o MBRE deve começar a funcionar até o fim deste ano.

Saiba mais sobre Kioto

O correto é protocolo ou tratado? Ao entrar em vigor, o acordo passou a ser chamado pela ONU de Tratado de Kioto.

O Brasil é obrigado a cumprir metas? Não. O Brasil, como os demais países em desenvolvimento, embora tenha ratificado o tratado, não é obrigado a cumprir metas específicas de redução de gases do efeito estufa.

Quais as metas do acordo? Seu principal objetivo é reduzir as emissões dos países industrializados de gases associados ao aquecimento global. Ele foi estabelecido em 1997 e entrou em vigor ontem. Os países industrializados que o ratificaram se comprometeram a, juntos, reduzirem suas emissões até 2012 em 5,2% abaixo dos níveis de 1990. Cada país tem metas próprias. Porém, a ONU diz que os países estão longe de cumprir suas metas.

O que acontece com quem não cumprir seus compromissos? As regras a esse respeito são pouco claras, mas na prática, o prejuízo será político.

Qual o maior obstáculo ao êxito de Kioto? A recusa dos EUA, os maiores poluidores do mundo, em ratificar o acordo alegando que ele traria prejuízos a sua economia. Os EUA pressionam ainda para que Brasil, Índia e China sejam obrigados a fazer cortes de emissões.

Quais os efeitos práticos do tratado? Cientistas dizem que serão mínimos. Sua maior importância é mostrar o comprometimento da comunidade internacional com o combate das mudanças climáticas.