Título: A GUERRA SUJA DO LIXO
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Fonte: O Globo, 19/02/2005, Rio, p. 13

UUm dia depois de fiscais do Ibama multarem a prefeitura em R$500 mil por despejo de lixo acima do que o aterro de Gericinó poderia suportar, o prefeito Cesar Maia retirou os 24 guardas municipais e 78 garis que mantinha no Parque Nacional da Tijuca e no Jardim Botânico do Rio, que são administrados pelo órgão federal. O afastamento das equipes de limpeza e segurança sem aviso prévio atingiu cartões-postais como o Cristo Redentor, as Paineiras e a Vista Chinesa, localizados no Parque da Tijuca. Cesar alega que retirou o pessoal dentro de um processo de reavaliação de todos convênios que a prefeitura mantém com outros órgãos. E que isso seria uma atitude normal de início de um governo ¿ embora ele tenha sido reeleito. No Parque da Tijuca, Ibama e prefeitura têm desde 1999 um convênio de gestão compartilhada da área, que fora renovado em dezembro passado.

¿ Todos os contratos e convênios estão sendo revistos. Não há prazos ¿ alegou o prefeito.

O gerente-executivo do Ibama no Rio, Édson Bedin de Azeredo, no entanto, entendeu o caso como uma represália. Em ofício encaminhado a Cesar, pediu que ele reconsiderasse a decisão, mas não foi atendido. Bedin argumenta que a informação de que a prefeitura seria multada não teria passado de um mal-entendido. A falta de limpeza já era evidente em algumas áreas ontem: trilhas do Parque Lage já estavam totalmente tomadas por folhas secas.

¿ A situação em Gericinó foi uma emergência porque o aterro de Jardim Gramacho estava fechado. Não haverá multas ¿ disse Bedin.

À noite, o procurador-geral do Ibama, Carlos Alberto Pires e Albuquerque Júnior, obteve uma liminar na 10ª Vara Federal determinando a volta imediata dos guardas e garis e tentava notificar a prefeitura. Mas enquanto a situação não for normalizada, a PM e a Polícia Federal vão assumir a segurança das áreas. Durante o dia de ontem, apenas dois guardas municipais ainda permaneciam no Corcovado:

¿ Eles são do Grupo de Atendimento ao Turista que mantemos para auxiliar o visitante em vários pontos da cidade. Os que estavam pelo convênio já estão sendo relotados em parques da prefeitura ¿ disse o comandante da Guarda Municipal, Carlos Moraes Antunes.

Setor de turismo critica a decisão

Para o presidente da Comissão de Meio Ambiente da Assembléia Legislativa (Alerj), Carlos Minc (PT), que organizou a blitz no aterro de Gericinó, os parques foram vítimas da guerra do lixo entre Cesar Maia e a prefeitura de Caxias, que quer cobrar pedágio pela entrada de caminhões da Comlurb no aterro de Gramacho. Por conta da briga, a prefeitura por dois dias jogou lixo acima do tolerado no aterro da Zona Oeste do Rio.

¿ Em 2004, a comissão inspecionou e com auxílio do Ibama multou aterros irregulares em 21 cidades. Muitas eram administradas pelo PT ou tinham pessoas do partido na equipe. Não fui a Gericinó por motivos políticos. E nem desejo abrir um front nos parques federais dessa guerra do lixo ¿ disse Minc.

A decisão do prefeito irritou o setor turístico. A avaliação é que o Rio terá prejuízo com a piora da qualidade dos serviços em locais que recebem grande número de visitantes. Vera Potter, vice-presidente da Associação Brasileira dos Agentes de Viagem (Abav), lembra que a limpeza é sempre apontada como um dos pontos fracos da cidade.

¿ Essa iniciativa é uma agressão do prefeito contra a cidade. Manter pontos turísticos limpos e protegidos não é um benefício apenas para o visitante mas também para o próprio morador do Rio ¿ disse.

O diretor do Trenzinho do Corcovado, Sávio Neves, diz que a retirada das equipes agrava problemas do Parque da Tijuca que a prefeitura tem se revelado incompetente para resolver. Cita como exemplos os flanelinhas e guias mirins que cercam visitantes no Cosme Velho, cobrando preços exorbitantes.

¿ Antes mesmo dessa medida a qualidade dos serviços de limpeza já tinha piorado. No fim de 2004, o condomínio de empresas que trabalha no Corcovado decidiu contratar uma empresa de limpeza já que os serviços da Comlurb deixavam a desejar ¿ acrescentou Sávio Neves.

Bela Catarina Seabra, proprietária da Jeep Tours, empresa que diariamente leva cem turistas para conhecer o Cristo Redentor e outros pontos do Parque da Tijuca, engrossa as críticas a Cesar:

¿ Os parques nacionais têm que ser tratados pela prefeitura como partes integrantes do Rio ¿ disse.

No Jardim Botânico, onde a prefeitura cuidava apenas da limpeza, o presidente, Liszt Vieira, disse que antes da decisão a Comlurb já havia reduzido suas equipes, comprometendo a qualidade do serviço. Ele pretende deslocar serventes e jardineiros mirins que fazem cursos no local para ajudar na limpeza do parque enquanto não contrata uma empresa, caso a prefeitura realmente não volte a cuidar da limpeza.

¿ Recebemos cerca de 500 mil visitantes por mês, que serão prejudicados por uma questão que me parece política. Se o esquema de emergência não der conta da limpeza, vou ter que adotar outras medidas, como fechar o Jardim Botânico um dia na semana para conservação, mas isto não é o ideal.