Título: LUIZ ESTEVÃO FAZ OBRA COM DINHEIRO PÚBLICO
Autor:
Fonte: O Globo, 20/02/2005, O País, p. 17

Depois de ser processado pelo desvio de R$169 milhões na construção da sede do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) em São Paulo, perder o mandato e ter parte dos bens bloqueados, o ex-senador Luiz Estevão conseguiu, por meio de uma de suas empresas, executar a obra de construção do metrô de Brasília, financiada com recursos públicos.

¿ É inacreditável que depois de tudo o que aconteceu ele esteja executando obras públicas ¿ disse a procuradora da República Janice Ascari, responsável pelas investigações do TRT-SP.

A procuradora Adriana Machado, uma das responsáveis pela investigação, decidiu cobrar explicações do consórcio formado pela Andrade Gutierrez e pela Serveng Civilsan, encarregado das obras gerais. O consórcio venceu a licitação, mas repassou parte dos serviços para a empresa de Luiz Estevão.

Embora sustente que não está proibido de executar obras públicas por causa do processo pelos desvios no TRT, Estevão está sendo acusado de novas irregularidades. O Ministério Público do Trabalho investiga denúncia de que a Data Construções, empresa do ex-senador, tem contratado irregularmente operários para trabalhar na construção de seis estações do metrô do Distrito Federal.

Empresa é acusada de não recolher FGTS devidamente

A empresa do ex-senador é acusada de não assinar a carteira dos trabalhadores, de não recolher corretamente o FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) e os impostos previdenciários e de não respeitar as normas de saúde e segurança do trabalho. Tirando proveito do excesso de mão-de-obra na construção civil, a empresa estaria reagindo com demissão a eventuais reclamações.

Procurado pelo GLOBO, o ex-senador negou a existência de trabalhadores sem carteira assinada na Data Construções.

¿ O único sem carteira assinada lá sou eu ¿ afirmou.

O porta-voz do governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz (PMDB), Paulo Fona, não quis comentar as supostas irregularidades nas contratações da Data.

O ex-senador não esconde a ligação com a obra. E até usa o local para fazer propaganda do Brasiliense, time que criou após a cassação no Senado. Num canteiro, uma placa anuncia que a estação do metrô tem o mesmo apelido do time: Jacaré.

A empresa do ex-senador foi criada depois do escândalo do TRT-SP vir a público e não está na relação do patrimônio dele bloqueado pela Justiça para garantir, em caso de condenação, a reparação ao dano público. Por isso, Estevão consegue receber por serviços prestados ao setor público, mesmo tendo ainda com contas a prestar sobre o dinheiro desviado do TRT-SP. Ainda não há condenação judicial contra ele.

As suspeitas de irregularidades surgiram em 2002 e, desde então, denúncias chegam ao Ministério Público, à Delegacia Regional do Trabalho e ao Sindicado dos Trabalhadores da Construção Civil. Em 18 de agosto do ano passado, fiscais do trabalho identificaram 142 trabalhadores sem carteira assinada nos canteiros de obras da Data Construções, no trecho do metrô entre Taguatinga e Ceilândia, cidades-satélites do Distrito Federal.

Por força da fiscalização, a empresa assinou as carteiras de trabalho dos peões, mas investigações do Ministério Público mostram que os pões que têm carteira assinada são demitidos e substituídos por outros sem carteira assinada. O fiscais do trabalho têm também relatos de operários contratados como se fossem fornecedores de matéria-prima.

O Ministério Público sustenta ainda que há operários contratados sabendo que serão demitidos sem chances de reclamar à Justiça. Em depoimento ao procurador do Trabalho, Joaquim Rodrigues Nascimento, o operário Haroldo Miranda confirmou a queixa de outros colegas levadas ao Ministério Público contra a Data Construções.

Miranda disse ao procurador que ¿assinou termo de responsabilidade proibindo o empregado (ele próprio) de ajuizar ação trabalhista, que quando entram na empresa, os empregados são obrigados a assinar documento no sentido de que estão vendendo material de construção¿.

¿ Ele (Estevão) é milionário e está tirando do pobre numa obra pública ¿ disse um dos investigadores do caso.

O Ministério Público suspeita ainda que Data Construções seja uma empresa virtual. Os fiscais do trabalho foram nove vezes ao endereço da empresa no Edifício Assis Chateaubriand, numa área central de Brasília, mas a loja estava de portas fechadas e vazia. Em julho de 2003, Estevão passou parte de suas cotas na empresa para outra de nome Partpar Administração, que tem entre seus sócios principais Cleucy Meirelles, mulher do ex-senador. Até agora, os fiscais não conseguiram intimar Estevão ou qualquer outro dirigente da Data Construções.

¿ É uma situação inaceitável em qualquer lugar, principalmente em Brasília, na capital do país ¿ diz João Barbosa de Almeida, diretor do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil do Distrito Federal.