Título: UM CORREGEDOR QUE PRESERVOU MAIS DO QUE PUNIU
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Fonte: O Globo, 22/02/2005, O País, p. 8

Durante quatro anos, entre 1997 e 2000, o novo presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), foi o corregedor-geral da Casa. Era ele quem decidia o destino das denúncias contra deputados que chegavam às suas mãos: se seriam arquivadas ou se abriria procedimento para investigar. Como corregedor, Severino mais preservou do que puniu seus colegas. Das 31 denúncias protocoladas na Corregedoria no seu período, 22 foram arquivadas e apenas nove foram deliberadas. Neste período, três deputados foram cassados.

Os pareceres do corregedor orientam a Mesa Diretora, que vota de acordo com o seu relatório. Entre os 22 processos arquivados na gestão de Severino como corregedor, há casos envolvendo parlamentares que o apoiaram na sua campanha para a presidência da Câmara e o ajudaram na sua eleição. Entre eles, o deputado Robson Tuma (PFL-SP) e o líder do seu partido, José Janene (PP-PR). Em 2000, Janene foi acusado pela Promotoria do Patrimônio Público de Londrina (PR) de usar dinheiro público em campanha eleitoral. Severino julgou improcedente e recomendou o arquivamento.

¿ No meu caso, cabia a ele arquivar porque a denúncia era improcedente. Eu movi 50 ações contra os três promotores que me denunciaram ¿ afirmou José Janene, que afirmou não ter sido condenado na Justiça pelo caso.

Silas Câmara (PTB-AM) foi outro deputado que declara ter votado em Severino nos dois turnos da eleição da Câmara e teve, em dezembro de 2000, seu processo arquivado pelo então corregedor. Silas Câmara foi acusado por outros dois parlamentares de obter, de forma irregular, carteira de identidade e CPF.

¿ Foi feita justiça, graças a Deus. Não existia fundamentação legal naquela denúncia ¿ afirma Silas Câmara.

Talvane, Hildebrando e Naya foram cassados

Perguntado se ele votou em Severino, o deputado amazonense disse:

¿ Eu e mais 299 deputados.

Dois eleitores entusiastas de Severino também tiveram seus processos arquivados pela Mesa Diretora. Robson Tuma foi denunciado, em 2000, pela então deputada Elcione Barbalho (PMDB-PA), por ofensa à honra durante reunião da CPI do Narcotráfico, no Rio, em março daquele ano. A assessoria do deputado afirmou que o processo foi arquivado a pedido da própria deputada, que teria reconsiderado e julgou o episódio como um mal-entendido. Alberto Fraga (PTB-DF), também denunciado na Corregedoria, teve seu processo arquivado.

No período em que Severino foi corregedor, foram cassados três deputados, cujos casos foram de grande repercussão nacional: Talvane Albuquerque, em 2000, acusado de envolvimento no assassinato da deputado Ceci Cunha (PSDB-AL); Hildebrando Paschoal, acusado de participar de tráfico de droga; e Sérgio Naya, dono da construtora do Palace II, por denúncia de falsificação de documento.

Dos outros seis casos deliberados pelo corregedor, dois deputados renunciaram, em 1997, ao mandato: Ronivon Santiago e João Maia, acusados de terem vendido seus votos na aprovação da emenda da reeleição para presidente da República. Outros três casos, da mesma acusação e envolvendo os deputados Chicão Brígido, Osmir Lima e Zilá Bezerra, foram considerados improcedentes pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), também em 1997.

A biografia de Severino, na internet, afirma que, como corregedor, o deputado pediu a cassação de mandato de 11 deputados envolvidos em denúncias de quebra de decoro parlamentar, ¿um recorde na história do Congresso¿. Mas foram cassados, de fato, apenas três.

¿ O corregedor não tem a obrigação de condenar ninguém. Em nenhum caso ele agiu de maneira a proteger quem quer que seja. Arquivou os casos que tinha que arquivar. Como corregedor, Severino foi implacável e pediu a cassação de 11 deputados, um recorde ¿ afirmou Janene.