Título: PISANDO LEVE
Autor:
Fonte: O Globo, 23/02/2005, Panorama Político, p. 2

A queda machuca mas também ensina. Num primeiro sinal de ajustamento à nova correlação de forças no Congresso, o ministro Palocci discutiu a MP 232 com os líderes partidários e admitiu negociar seu conteúdo, desde que se encontrem fórmulas para preservar a arrecadação. Em outros tempos, o governo tentaria acionar o rolo compressor da maioria, agora emperrado.

O movimento de empresários e profissionais liberais contra a medida que aumenta impostos tomou forma ainda antes da eleição dos novos dirigentes do Congresso mas agora lhes serve de cavalo de batalha para a primeira demonstração de força ao governo. E este parece ter compreendido que terá mesmo de negociar e ceder, pelo menos nesta hora de afirmações e demarcação de territórios. Severino Cavalcanti encampou a batalha contra a MP na primeira hora de sua eleição. O mesmo fez Renan Calheiros, embora o novo presidente do Senado esteja sendo mais sutil e elegante em suas comunicações ao governo.

Na Câmara, onde a medida será votada primeiro, os deputados querem suprimir todos os seus artigos, deixando apenas aquele que corrige a tabela do imposto de renda dos trabalhadores. Não é o que deseja a Fazenda, que negociará tendo como mediador o ministro Aldo Rebelo. E embora os aliados sempre tenham brigado por relatorias na Câmara, desta vez querem empurrar o abacaxi para um petista. O mais talhado, na bancada, por sua formação de economista e tributarista, está queimado. Seria Virgílio Guimarães, que foi o relator da reforma tributária.

Se a negociação sugere mais humildade na relação com os aliados, a demora do PT para escolher seu novo líder indica os cuidados que estão sendo tomados para não repetir os erros cometidos na escolha do candidato a presidente da Câmara. No PT, diz uma velha piada, nem o iogurte é natural, muito menos os candidatos. O deputado Paulo Rocha quase chega a sê-lo mas a reunião para confirmá-lo entrou noite adentro discutindo a escolha das quatro comissões técnicas que o partido reivindicará. Constituição e Justiça (CCJ) e Tributação e Finanças serão as duas primeiras prioridades. A CCJ é importantíssima por ter início ali a tramitação de qualquer proposição legislativa. Mas a escolha de seu presidente também exigirá cuidados. Terá que ter perfil jurídico e talento para a negociação política. E não poderá alimentar a ilusão de que o cargo é passaporte para outras posições, vício de todos que se sentam naquela cadeira.

Já o presidente Lula continua mudo sobre a reforma ministerial, da qual só tratará a partir da semana que vem. Aborrecido com petistas e aliados, mas animado com os índices de sua popularidade revelados pela pesquisa CNT/Sensus.