Título: TERROR COM VOTOS
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Fonte: O Globo, 27/01/2006, Opinião, p. 6

Acomparação está na ponta da língua: a vitória do Hamas nas eleições parlamentares palestinas equivale à explosão de um homem-bomba no complexo e tenso cenário político do Oriente Médio. E a primeira reação dos interessados foi, inevitavelmente, de susto e perplexidade.

O primeiro-ministro palestino renunciou de imediato. Sua facção, a Fatah, a qual também pertence o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, advertiu ¿ um tanto precipitadamente, porque talvez tenha de rever sua posição ¿ que não participará do governo com o Hamas.

Do outro lado da mesa, Israel declarou pela milésima vez que não negociará com o Hamas, independentemente do resultado da votação. Observa que não tem sentido se sentar com um bando de terroristas cuja primeira obrigação, como parte do governo palestino, seria justamente combater o terror.

Representantes eleitos do Hamas também parecem julgar imprescindível aproveitar o momento para repetir que o grupo não pretende depor as armas, nem tem intenção de fazer acordos com Israel. Diferentemente da Fatah, que renunciou à luta armada, e hoje é pelo convívio de israelenses e palestinos na Terra Santa, o Hamas prega a destruição de Israel.

No entanto, apesar das reações negativas, a vitória eleitoral do movimento que Israel, Estados Unidos e União Européia chamam de terrorista reflete incontestável e legitimamente a vontade da maioria dos palestinos de Gaza, Cisjordânia e Jerusalém Oriental. E tem um significado animador: mostra que extremistas palestinos já contemplam a possibilidade de uma solução política para o conflito palestino-israelense.

Para fazer bom uso da recém-conquistada maioria, o Hamas deveria abjurar, em termos inequívocos, o objetivo declarado de destruir Israel, e conduzir-se daqui para a frente como partido político, comprometido com as regras da democracia. Em contrapartida, Israel, EUA e UE retirariam suas objeções.

Com intransigência será impossível desatar o nó. Mas se houver inteligência para aproveitar as novas possibilidades, o êxito do Hamas terá sido um avanço na rota da moderação.