Título: FMI DIZ QUE `OS POBRES PERDERAM A PACIÊNCIA¿
Autor: Deborah Berlinck
Fonte: O Globo, 28/01/2006, Economia, p. 27

Na Suíça, diretor-gerente do Fundo afirma ainda que América Latina precisa de agenda de crescimento econômico

DAVOS (Suíça). O diretor-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Rodrigo de Rato, disse ontem que a América Latina precisa de uma ¿agenda de crescimento¿. Num discurso sem meias palavras, durante um jantar em Davos para empresários, intelectuais e membros de governos da América Latina, ele afirmou que o grande desafio para o continente permanece: acabar com a desigualdade de renda.

¿ Os pobres perderam a paciência ¿ alertou.

Rato começou dizendo que havia coisas positivas e negativas em relação à America Latina, e pediu para citar uma ruim: desigualdade de renda, que, segundo ele, está ¿afetando o ambiente político¿. Depois de afirmar que os pobres perderam a paciência, emendou:

¿ Isso será um tremendo desafio para os governos. Desigualdade de renda é o grande desafio. E não é só uma questão de má sorte ¿ disse Rato, listando, sem citar países, problemas como o nível de eficácia das despesas públicas, o investimento em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) e impostos.

Rato: neste momento de eleições é preciso crescer

Rato insistiu num ponto: falta mais crescimento. Ele disse que o ambiente macroeconômico é bom, com a maioria dos países tendo reduzido a inflação para um dígito e a dívida controlada, mas que é preciso passar a outra etapa. Na platéia, estavam o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, e os ministros do Desenvolvimento, Luiz Fernando Furlan, e da Cultura, Gilberto Gil, além do vencedor do prêmio Nobel Joseph Stiglitz. O ex-presidente do BC Armínio Fraga moderou o debate.

¿ Neste momento de eleições, é preciso uma agenda para o crescimento. Mas não acho que alguém pensa hoje que sacrificar a estabilidade macroeconômica vai levar a mais crescimento. As conquistas dos últimos anos têm de ser consolidadas. Mas é preciso micro-reformas ¿ disse, citando os setores financeiro e trabalhista.

Rato terminou o discurso com uma mensagem mais política: disse que os países da América Latina precisam ser mais governados por coalizões e parlamentos estáveis. Várias outas pessoas falaram no jantar. Gilberto Gil disse que ¿seja lá quem vier depois do Lula¿, vai ter que seguir a mesma agenda. Armínio Fraga defendeu o ¿Consenso de Washington¿, isto é, medidas ortodoxas que viraram cartilha nos anos 90, mas que acabaram sendo duramente criticadas. Na platéia, Joseph Stiglitz, um crítico destas medidas, estranhou.

Meirelles: para ser China e Índia é preciso continuidade

Antes do jantar, Meirelles, numa entrevista a jornalistas brasileiros, disse que o aumento das taxas de crescimento do Brasil é questão de tempo. Perguntado por que o Brasil não estava crescendo rapidamente como China e Índia, ele disse que esses países começaram suas reformas bem antes. Para Meirelles, é até bom que as pessoas façam esta comparação: o sucesso de crescimento dos asiáticos é a prova de que o Brasil deve insistir nas reformas e na estabilidade econômica.

O Brasil praticamente desapareceu da agenda de debates do Fórum Econômico. Só se falou em China e Índia. Mas o presidente do BC disse que parte da explicação para isso é que o país deixou de ser visto como problemático. Sem mencionar as eleições presidenciais, ele insistiu que se o Brasil quer chegar aos níveis da China e da Índia é preciso continuidade:

¿ Estamos no momento de transição para o país normal.