Título: `LULA É DERROTÁVEL, MAS VAMOS PRECISAR LUTAR¿
Autor: Adriana Vasconcelos
Fonte: O Globo, 29/01/2006, O País, p. 10

Um dos responsáveis pela escolha do candidato tucano, Aécio Neves diz que PSDB tem de ter humildade

Destacado pelo PSDB para ser um dos condutores do processo de escolha do candidato tucano à sucessão presidencial, o governador de Minas Gerais, Aécio Neves, antecipa que ela só deverá acontecer depois das prévias do PMDB, marcadas para o dia 19 de março. A partir do anúncio do adversário peemedebista, o partido decidirá ¿ baseado em outros critérios também ¿ se seguirá para a campanha com o prefeito de São Paulo, José Serra, ou o governador do estado, Geraldo Alckmin. Na sua opinião, o presidente Lula, apesar de todo o desgaste sofrido, continua sendo um candidato competitivo, e por isso recomenda que o PSDB calce as sandálias da humildade. A despeito da acirrada disputa travada hoje com o PT, o mineiro acredita na possibilidade de petistas e tucanos estarem juntos no futuro. Mas para isso, o novo presidente, sugere, terá de priorizar a reforma política, único instrumento capaz de libertar o país da polarização imposta pela política paulista.

O candidato tucano só será conhecido em março?

AÉCIO NEVES: Não temos por que antecipar nosso cronograma. Pelo contrário, temos de saber utilizar o tempo. Não precisamos nos antecipar por pressão de outros, nem deixar que o tempo nos engula. No final de março, após as prévias do PMDB, é o momento de anunciarmos o nosso candidato.

O que mais pesará na escolha?

AÉCIO: Competitividade. Precisamos que o candidato passe, não só para partido mas para o país, a sensação de que pode vencer as eleições e construir uma grande base. A dificuldade do presidente Lula para compor uma base num eventual segundo mandato será, certamente, um componente eleitoral desfavorável para ele.

As pesquisas indicam o início da recuperação do presidente Lula. Isso preocupa?

AÉCIO: O presidente Lula sempre foi e será um candidato competitivo. A força da máquina do governo não pode ser desprezada. O PSDB tem de repaginar o seu projeto e apresentar ao país um modelo de gestão mais eficiente, trazendo novamente esperança para as pessoas. Não podemos ficar passivamente achando que o desgaste do Lula nos trará, por gravidade, a Presidência da República.

Qual deverá ser a principal bandeira do partido?

AÉCIO: A do crescimento. Afastado o risco PT, o PSDB deve mostrar que, com sua credibilidade, terá condições de fazer uma inflexão na política de juros muito mais rápida e consistente, sem riscos, que possibilitaria uma retomada mais vigorosa do crescimento. Temos de apresentar também um projeto nacional de desenvolvimento para todas as regiões e, por fim, focar nossa competência em gerir o Estado.

Como fazer frente aos resultados positivos apresentados pelo governo Lula, como o aumento da renda do trabalhador, a redução do desemprego e a ampliação do programa Bolsa Família?

AÉCIO: O presidente Lula governou no mais favorável ambiente externo das últimas décadas. Comparado a nossos vizinhos, o crescimento do Brasil foi pífio. O presidente Lula, pela primeira vez, disputará a eleição na defesa. Não é uma eleição ganha para ninguém, mas o Lula hoje é um candidato derrotável. Mas vamos precisar lutar para vencer.

Depois de todo o tiroteio sofrido pelo governo, não era para o PSDB estar com uma folga eleitoral maior?

AÉCIO: Continuamos sendo a principal alternativa de poder e isso não é pouca coisa. A rejeição consolidada do presidente Lula será um complicador enorme, sobretudo no segundo turno. Mas acho que o PSDB deve calçar um pouco mais as sandálias da humildade. Não podemos perder tempo apenas em escolher um candidato, mas também na construção de uma forte estratégia eleitoral e na mobilização de nossas bases.

O prefeito Serra desponta como o candidato mais forte, já que o governador Geraldo Alckmin não é muito conhecido em várias regiões do país... Isso muda?

AÉCIO: As pesquisas são um fator favorável a Serra, mas o fato de Alckmin não ser muito conhecido é um fator favorável à candidatura dele. Porque onde ele é conhecido é muito bem avaliado. Não podemos nos restringir a pesquisas quantitativas. Estamos encomendando pesquisas qualitativas no Brasil inteiro, avaliando nossos adversários, suas vulnerabilidades, e a perspectiva de crescimento de nossos candidatos. Vamos fazer uma consulta ampla no partido a partir de agora.

Essa disputa interna não deixará seqüelas?

AÉCIO: Não há hipótese de haver qualquer dissidência. Nossa unidade será o combustível, o fermento inicial para a construção da nossa vitória.

A queda da verticalização muda o quadro eleitoral?

AÉCIO: A queda da verticalização levará o PMDB a ter um candidato, o que isolará ainda mais o presidente Lula. Será mais um a fazer campanha atacando o governo, criando num eventual segundo turno uma forte corrente contra o presidente Lula.

Qual seria o adversário preferido do PMDB: Anthony Garotinho ou Germano Rigotto?

AÉCIO: Não há preferência. Confesso que sempre achei positivo para nós que o PMDB tivesse um candidato. Não seria interessante uma aliança do PMDB com o PT no primeiro turno.

O PFL continua sendo o aliado preferencial dos tucanos?

AÉCIO: Vamos trabalhar para que o PFL esteja conosco desde o início.

Os tucanos estão preparados para uma disputa dura?

AÉCIO: Espero sinceramente que chegue um dia ¿ a partir de uma reforma política que deverá ser a prioridade para o dia seguinte da posse do novo presidente ¿ em que essa radicalização política nascida em São Paulo, entre PT e PSDB, não prevaleça no cenário nacional e dê espaço para a construção de um grande projeto de país onde haja a presença do PSDB, do PT e outras forças políticas que tenham pensamentos próximos. Na verdade, o que separa hoje o PT e o PSDB não é um grande distanciamento de idéias, de compreensão de país ou de modelo econômico, sobretudo a partir da evolução que o PT teve. É muito mais a disputa pelo poder. A repercussão da política paulista hoje no país é muito forte e todos nós somos reféns dessa polarização. Acho que vai chegar um momento em que ela deixará de prevalecer.