Título: HORÁRIO NOVO, DRAMA ANTIGO PARA SEGURADOS
Autor: Maiá Menezes e Tatiana Farah
Fonte: O Globo, 29/01/2006, O País, p. 12

Ampliação no atendimento, agora até as 18h, não impede filas durante a madrugada em agências do INSS

RIO, SÃO PAULO, RECIFE e PORTO ALEGRE. A ampliação em quatro horas no horário de atendimento do INSS ainda não serviu para alterar a rotina dramática de pensionistas, aposentados e contribuintes. Nas madrugadas do Rio, de São Paulo, Recife e Porto Alegre, é fácil constatar a peregrinação de quem necessita dos serviços dos postos do instituto. Atrás de senhas e da chance de resolver pendências com a Previdência, centenas de idosos, doentes e deficientes lotam as filas nos quarteirões vizinhos aos locais de atendimento.

Gente como o policial aposentado Nilson Paulo de Omena Torres, de 62 anos, para quem a extensão do horário de atendimento para as 18h foi inócua. Ele chegou à fila do posto do Irajá, na Zona Norte do Rio, às 22h da última quarta-feira. E lá passou a noite, sentado em uma cadeira de praia, acompanhado por cerca de cem pessoas. Conseguiu ser atendido às 9h de quinta-feira. Nilson, que já foi outras três vezes ao posto, disse que foi instruído por um segurança, da última vez, a chegar mais cedo, para evitar filas. Quando chegava às 7h, era atendido apenas à tarde.

¿ Não senti melhora alguma ¿ disse Nilson.

Briga por venda de lugar na fila

Em São Paulo, a realidade é semelhante. No INSS de Santa Marina, na Zona Norte, meia hora antes da abertura do posto, às 5h30m de quinta-feira, a fila chegava a 210 metros. Eram 400 pessoas, entre idosos e trabalhadores em licença médica. Para garantir vaga, as pessoas começaram a chegar por volta das 21h30m do dia anterior, que era feriado na cidade.

Às 6h, quando o segurança abriu a porta, Ivone Aparecida Pereira, de 36 anos, começou a discutir com outro homem. Ela o acusava de comprar um lugar na fila por R$10. Ele negava.

¿ Pode abrir às seis, mas temos de ver a que horas começa a funcionar lá dentro, já que a gente passa a noite aqui e ainda espera até as duas da tarde. Fiquei brava com aquele homem, o dos R$10, porque eu estava feliz de, pela primeira vez, estar entre os primeiros da fila, mesmo ficando embaixo da chuva.

No posto de São Gonçalo, no Grande Rio, Helena Coutinho, de 46 anos, já considera um avanço não ter que comprar lugar na fila. Helena chegou às 5h da quarta-feira, para fazer uma perícia médica:

¿ Antes era um caos. Já comprei lugar na fila por R$50. Hoje cheguei às 5h e já consegui ser atendida (por volta das 10h). Tinha mais de cem pessoas na fila.

O atendimento nos quatro postos visitados pelo GLOBO no Rio continua sendo controlado por senhas. Mas quem chegou depois da distribuição, durante o horário, que prevê dez horas de atendimento por dia, conseguiu entrar nas agências. As senhas foram proibidas pelo Ministério da Previdência. Elas ainda estão sendo usadas, de acordo com os chefes de agência, apenas para controlar o atendimento ¿ e não mais para impedir o acesso dos que chegarem depois das 8h. O atendimento vai até as 18h.

A chefe da agência de Padre Miguel, Luci Lomba, explica que as mudanças determinadas pelo Ministério da Previdência serão sentidas aos poucos:

¿ Por mais que a gente divulgue, as pessoas estão custando a entender. Estou abrindo às 7h, para diminuir esse fluxo. Abro para acomodar as pessoas. Estendendo o horário, esse fluxo vai diminuindo.

No posto do Irajá, o aposentado Aryobar Mesquita Filho, de 50 anos, chegou às 6h e pegou a senha para a mãe, Florinda Mesquita, de 76 anos, pensionista do INSS:

¿ A fila estava dobrando a esquina na hora que cheguei.

A pensionista Dilma Valentino Tavares, de 69 anos, elogiou a nova forma de atendimento:

¿ Eu não me preocupei em chegar mais cedo. Peguei meu número às 8h, logo depois de ter chegado ¿ disse Dilma.

A aposentada Amélia Pereira, de 69 anos, afirma que a filha de 43 anos, aposentada por problemas psiquiátricos, já dormiu na fila do posto de São Gonçalo para conseguir ser atendida:

¿ Se eu disser que o atendimento está bom, estarei mentindo.

¿Melhorou, mas não resolveu¿

A via-crúcis de quem procura o INSS se divide em dois momentos: um para marcar consultas e resolver problemas de documentos; outro para enfrentar a perícia. Todos os trabalhadores periciados têm hora marcada. O problema é que é o mesmo horário para todos: 13h.

¿ O novo horário melhorou, mas não resolveu ¿ disse José Carlos Paixão, 41 anos.

Osvaldo chegou ao posto Santa Marina, em São Paulo, às 7h e saiu às 15h30m. Mora em Parada de Taipas, Zona Norte, e pegou dois ônibus. Estava sem almoço e muito nervoso:

¿ A minha filha tem problema de pressão.

O posto de Santa Marina costumava abrir às 7h. A espera na fila era maior. Fátima Lima Vieira, 45 anos, aproveita a fila da madrugada para vender café, leite e bolo de cenoura e não gostou do novo horário.

¿ Melhorou para eles, piorou para mim¿ disse.

*Especial para O GLOBO

COLABORARAM Letícia Lins e Chico Oliveira