Título: O RUMO DOS VENTOS
Autor: Helena Chagas
Fonte: O Globo, 30/01/2006, O País, p. 4

É razoável prever que, até outubro, haverá muita mudança no rumo dos ventos da mais disputada eleição dos últimos 17 anos. As águas de janeiro, sem dúvida, correram para Lula. Se os sinais da recuperação presidencial, a bordo de boas notícias como o salário-mínimo e a redução do desemprego, vão se confirmar e consolidar, não se sabe. Mas o quadro muda, e não só por aí.

Novos ingredientes, como a derrubada da verticalização das alianças eleitorais nos estados, entram em cena. Outros mais antigos, como a briga de foice entre os tucanos pela candidatura, passaram de latentes a manifestos. Nesse cenário, desenrolam-se novos movimentos dos protagonistas. Por exemplo:

1. O Planalto acha que Lula sobe nas próximas pesquisas e que Serra pode desistir de largar a prefeitura. A última pesquisa do Ibope apontando uma recuperação de Lula, que voltou ao empate técnico com Serra, foi fechada antes do pronunciamento presidencial em rádio e TV sobre a quitação com o FMI, do anúncio do novo mínimo e da divulgação dos novos dados sobre a redução do desemprego e o aumento da renda dos assalariados. A expectativa no Planalto é que isso se traduza em três ou quatro pontos nas próximas rodadas. O raciocínio é que, consolidada uma tendência de crescimento, se Lula tirar vantagem sobre Serra até o fim de março, o prefeito pode pensar duas vezes antes de deixar o cargo e passar o abacaxi, já não tão doce, a Alckmin.

2. PMDB governista admite rever candidatura própria em junho. Quando Lula estava totalmente por baixo e parecia que nem se levantava mais, os pragmáticos governistas do PMDB passaram a defender com ardor a candidatura própria e as prévias. Agora, estão repensando. Mas não têm pressa. Vão ficar com um pé em cada canoa o máximo que puderem. O pulo do gato em relação às prévias de 19 de março é o prazo de inscrição, esticado até a véspera. Assim, podem incluir de última hora um terceiro nome, além de Rigotto e Garotinho, na medida para desistir e, na convenção de junho, virar vice de Lula. Bem, esse é mais ou menos o plano ¿D¿ do PMDB, que quer sempre se garantir em todas as frentes. Os outros são cristianizar Rigotto, cristianizar Garotinho e ficar avulso na eleição.

3. Fim da verticalização pode ajudar Garotinho. Enquanto a decisão de ter candidato a presidente equivalia à perspectiva de ficar amarrado nas coligações estaduais, com a verticalização obrigatória, o destino inexorável dessa candidatura era a lata de lixo. Daí a preferência dos caciques e governadores por Rigotto, um candidato mais maleável. Agora, porém, que a candidatura própria não vai atrapalhar a vida de ninguém nos estados, por que não escolher quem está melhor nas pesquisas e deixar o sujeito em paz? O que não quer dizer, absolutamente, apoiá-lo de verdade ¿ sobretudo se Lula estiver a caminho da reeleição.

4. Com mais candidatos no cenário, certeza de segundo turno. O problema da verticalização é que o assunto é tão complicado, mas tão complicado, que nem seus próprios beneficiários podem garantir, depois de somar lé com lé, cré com cré, que ela de fato vai ajudar. Lula, por exemplo. Ganhou por um lado, mas colocou no páreo candidaturas que não existiriam e que podem lhe tirar votos à esquerda: Roberto Freire, Cristovam Buarque...

5. Lula não vai obrigar peemedebistas a deixar ministérios, mas vai querer fidelidade. Ele deixou claro na última conversa com Renan e Sarney: mesmo depois da prévia, o ministro peemedebista que não for candidato pode ficar, mas tem que trabalhar por ele em seu estado. É nesse sentido que o presidente usa a palavra bigamia.

6. Em observação: o fim das CPIs. O governo não quer Lula no relatório e o PSDB não quer o prosseguimento das investigações até chegar no caixa dois tucano. Acordão à vista.

7. PFL quer que PSDB antecipe escolha de candidato.Os pefelistas estão preocupados com a briga e a demora tucana. Por eles, o PSDB anunciava Serra até o fim de fevereiro, e não de março. É que, enquanto a tucanada briga, a oposição fica sem candidato. E o governo, embora não declare, está com o seu em campanha há tempos...

8. Discurso da economia e da distribuição de renda pode se sobrepor ao da ética. As CPIs perderam o fôlego e não conseguiram encontrar mais nada. O cidadão anda saturado de crise política. Abre-se espaço para o discurso da economia, do social e da comparação dos números.