Título: AINDA ALTA
Autor: George Vidor
Fonte: O Globo, 30/01/2006, Economia, p. 18

Com a queda do chamado risco-país (índice que avalia o prêmio que o Brasil precisa pagar no exterior aos que nos emprestam dinheiro) para menos de 3% sobre os rendimentos dos papéis do Tesouro americano, a taxa de juros para financiamentos de longo prazo ¿ a TJLP ¿ concedidos pelo BNDES já poderia ser reduzida para 8,5% ou 8% ao ano, estimulando assim os investimentos.

A TJLP tem relação direta com o risco-país, a inflação e a desvalorização esperada para o real frente às moedas mais fortes. Mesmo utilizando-se as projeções mais pessimistas para esses números, uma TJLP, como a atual (9%) é elevada.

O efeito perverso dos juros exageradamente altos pode ser medido no comportamento do emprego. Nos dois últimos anos, a economia brasileira gerou cerca de três milhões de empregos formais, dos quais a construção civil se limitou a 170 mil. Tradicionalmente, a indústria da construção respondia por pelo menos nos 10% dos empregos. Desse modo, pode-se dizer que 130 mil empregos deixaram de ser gerados por um setor que tem capacidade ociosa.

Em julho do ano passado, em um agradável almoço de aniversário de um amigo comum, no Rio, fiz uma ¿aposta¿ com José Roberto Dias Leme. Ele, que trabalhou por muitos anos na Voz da América e hoje vive com a família perto de Houston, dizia que as cotações internacionais do petróleo chegariam a US$80 em 2005, e eu discordei. José Roberto então, com sua experiência, me alertou que os serviços de metereologia previam uma série de furacões no Golfo do México (a tragédia do Katrina ocorreria semanas depois, no fim de agosto), e que havia mais agravantes do que atenuantes na conjuntura do petróleo.

Na mensagem de fim de ano que me enviou pela internet, José Roberto se declarou derrotado na ¿aposta¿ e nesse caso me autorizava a ficar definitivamente com a moeda de US$0,25 (uma emissão especial, comemorativa do aniversário do estado do Texas) que ele tinha deixado como garantia da brincadeira.

Fiquei com a moeda, mas o ganhador de fato da ¿aposta¿ foi o José Roberto, pois entramos em 2006 com as cotações do petróleo se mantendo como uma pedra no sapato da economia mundial.

Ele agora volta a prever que o petróleo pode chegar aos US$80 por barril, e ainda no primeiro semestre. Desta vez não vou me arriscar a ter de devolver a moeda que ele me deu, embora torça para os preços do petróleo recuarem para um patamar que não ameace o bom momento da economia mundial. De qualquer forma, nunca os programas de conservação de energia e uso de fontes renováveis se mostraram tão necessários.

O grupo Usiminas, com uma produção total de 9,5 milhões de toneladas anuais nas suas duas usinas (Ipatinga, em Minas, e Cosipa, em Cubatão) é o maior produtor de aços planos no Brasil, mas só manterá essa liderança se de fato vier a construir uma nova unidade, com capacidade para cinco milhões de toneladas. O investimento dependerá de parcerias, especialmente de um sócio que abra mercados no exterior para venda de uma fatia considerável do aço que será produzido.

Mas enquanto o martelo não é batido, estudos continuam sendo feitos. A localização da terceira usina ficará no litoral (já que o investimento será basicamente voltado para a exportação) entre Vitória e Santos. Se a região próxima ao porto de Sepetiba/Itaguaí não tivesse sido escolhida para abrigar a siderúrgica CSA, da ThyssenKrupp/Vale do Rio Doce, seria o local ideal para receber a terceira usina da Usiminas. Agora algum entendimento teria de ser feito com a CSN, que também tem uma grande área reservada ali para construir, quem sabe um dia, uma nova usina (atualmente, a companhia está mais interessada em investir na exportação de minério de ferro do que no aço propriamente dito).

O Espírito Santo leva chance, com o novo ramal ferroviário que acompanhará o seu litoral sul, podendo chegar a Ubu, onde a empresa Samarco terá duas usinas de pelotização de minério de ferro.

Os grandes aviários produtores de ovos e os criadores de suínos geram toneladas diárias de esterco que são mal aproveitadas ou vendidas a preço baixo como adubo natural. Mas já há tecnologia disponível nos Estados Unidos e na Europa para utilização desse esterco em biodigestores capazes de produzir gás metano suficiente para mover usinas termoelétricas com potência instalada de mais de 3 megawatts (energia que pode suprir integralmente a maioria dos pequenos municípios brasileiros).

Esse gás pode servir como insumo para outros fins (gás de cozinha, combustível para veículos etc.) e os resíduos do processo são transformados em biofertilizantes líquidos e sólidos de alto valor no mercado internacional. O mais interessante é que tais projetos criam créditos de carbono, também negociáveis no mercado, já que várias empresas de países ricos signatários do Tratado de Kioto precisam deles para compensar a poluição que hoje contribui para o efeito estufa e aquecimento global.

O agronegócio brasileiro tem então mais uma frente para abrir, dando um passo em direção ao desenvolvimento sustentável.