Título: O RISCO DE DESCRÉDITO DO CONGRESSO
Autor: SÉRGIO CABRAL FILHO
Fonte: O Globo, 02/02/2006, Opiniao, p. 7

As corporações privadas estão hoje cada vez mais atentas ao que pensam os consumidores sobre os seus produtos e serviços. O nível de informação e interatividade propiciados pela imprensa e pela Internet obriga a que a empresa esteja em constante mudança, sob pena de deixar de satisfazer os seus consumidores e perder espaço para o seu concorrente mais antenado com as demandas do mercado.

A mesma lógica se aplica à atividade política. Já foi o tempo em que as principais decisões sobre a vida dos cidadãos eram tomadas pelos seus mandatários, sem qualquer tipo de controle por parte dos mandantes. Graças principalmente à Internet, o nível de interatividade entre o Parlamento e o cidadão é cada vez maior, sendo freqüente o recebimento por parte dos parlamentares de mensagens dos seus eleitores contendo a sua opinião sobre matérias polêmicas a serem votadas.

Assim como ocorre com a empresa privada, a instituição pública cujos membros não tomarem consciência das alterações nas suas relações com o seu eleitorado tenderá a cair em descrédito. Exemplo disso ocorreu recentemente, com o desgaste da convocação extraordinária do Congresso Nacional ao custo de cerca de cem milhões de reais. A reação da opinião pública foi tão forte que o Parlamento está, até que enfim, sendo obrigado a não só acabar com o pagamento de subsídios extras em caso de convocação extraordinária, como diminuir o período de recesso parlamentar. Mas se o Parlamento, porém, quiser efetivamente estar afinado com as demandas da população brasileira, terá que fazer mais do que isso.

O Congresso deveria acabar imediatamente com o absurdo voto secreto do senador e do deputado para todas as hipóteses previstas em lei: cassação de parlamentar, veto presidencial, eleição da Mesa, entre outras. O mandatário não deveria jamais poder esconder do seu eleitor o voto proferido em qualquer matéria.

O Congresso deveria instituir imediatamente o voto facultativo, porque o voto é um direito e não um dever, e o Brasil necessita do voto consciente, precisa do voto do eleitor que quer votar para melhorar o Brasil, e não do voto do eleitor que digita o número de qualquer candidato apenas para não pagar uma multa.

O Congresso deveria instituir de fato, na Câmara dos Deputados, o princípio ¿um homem um voto¿, de forma que o voto de todos os cidadãos tivesse o mesmo valor. Hoje, o voto do cidadão que vive em estados menos populosos como o Acre ou Roraima vale muito mais do que o do cidadão que vive no Rio de Janeiro ou em São Paulo, porque há uma regra na Constituição que cria uma representação mínima de oito deputados por Estado, independentemente da sua população. A instituição da representação dos Estados é o Senado Federal, onde cada Estado possui três senadores, independentemente da sua população. A Câmara é a instituição de representação por igual do cidadão brasileiro, independentemente de onde esse cidadão tenha seu domicílio eleitoral.

Esses são apenas alguns exemplos do muito que há por fazer no Congresso Nacional para colocar a política em sintonia com os anseios da sociedade moderna, constituída por pessoas cada vez mais bem informadas e interagindo cada vez mais com os seus representantes.

SÉRGIO CABRAL FILHO é senador (PMDB/RJ).