Título: MUÇULMANOS CLAMAM VINGANÇA
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Fonte: O Globo, 04/02/2006, O Mundo, p. 27

Manifestantes exigem ataques contra europeus. Governantes pedem calma e EUA condenam charges

COPENHAGUE

Os protestos em países de maioria muçulmana contra as charges que retratam o profeta Maomé se radicalizaram ontem. Depois das orações de sexta-feira, milhares de pessoas em diversos países prometeram vingança contra ¿alvos¿ como cartunistas, jornalistas, a Dinamarca, a França e o Ocidente como um todo. Enquanto isso, governos europeus tentavam acalmar os ânimos.

O premier da Dinamarca, Anders Rasmussen, teve um encontro ontem com 76 embaixadores. Na reunião ele lamentou a repercussão do caso, mas não pediu desculpas.

¿ Nem o governo nem a nação dinamarqueses podem ser responsabilizados por desenhos publicados num jornal dinamarquês. Esta é uma disputa entre alguns muçulmanos e um jornal.

O presidente da França, Jacques Chirac, também tentou acalmar os ânimos:

¿ A liberdade de expressão é um dos fundamentos da República. A França é um país laico, respeita todas as religiões. Peço um maior espírito de responsabilidade, respeito e cortesia.

O ministro de Relações Exteriores do Reino Unido, Jack Straw, elogiou ontem a imprensa britânica por não ter republicado as charges.

¿ Há liberdade de expressão. Mas não há qualquer obrigação de insultar ou de ser gratuitamente inflamatório. Acho que a republicação destas charges tem sido desnecessária, insensível, desrespeitosa e errada ¿ disse Straw.

O governo americano condenou a imprensa estrangeira que republicou as caricaturas de Maomé. Os principais jornais do país não divulgaram as imagens.

¿ As charges são ofensivas à crença dos muçulmanos. Reconhecemos e respeitamos as liberdades de imprensa e de expressão, mas elas precisam estar casadas com a responsabilidade da imprensa. Incitar ódios religiosos ou étnicos desta forma não é adequado ¿ disse o porta-voz do Departamento de Estado, Kurtis Cooper.

Houve líderes islâmicos que usaram as orações para tentar acalmar a situação. Intelectuais também fizeram pedidos neste sentido.

¿ Quando estamos seguros de nós próprios, não ficamos insultados facilmente. Acho que é papel do povo muçulmano mostrar que é seguro de si e não ter uma reação tão emotiva a charges de mau gosto ¿ disse o escritor iraniano Azar Nafisi, que mora nos EUA.

Bandeiras da Dinamarca são queimadas

Mas num dia em que importantes jornais, como o espanhol ¿El Pais¿ e o francês ¿Libération¿, republicaram as charges que saíram originalmente no jornal dinamarquês ¿Jyllands-Posten¿, as manifestações de repúdio se tornaram mais violentas. A embaixada da Dinamarca na Indonésia foi atacada por dezenas de pessoas, que quebraram janelas e atiraram ovos pobres.

Os protestos alcançaram países como Marrocos, Somália, Malásia e Turquia. Os maiores aconteceram em Paquistão, Síria, Líbano e Indonésia, além dos territórios palestinos.

¿ Não aceitaremos nada a não ser as cabeças cortadas do responsáveis ¿ gritou um pregador para os fiéis na mesquita al-Omari, em Gaza.

Em Ramallah, um protesto ameaçou realizar ações violentas contra países cujos jornais publicaram as charges. Bandeiras dinamarquesas foram queimadas também em Jerusalém. Em campos de refugiados palestinos no Líbano, manifestantes pediram que Bin Laden se vingue.

¿ Não ficaremos satisfeitos com protestos. A solução é cortar as mãos de quem desenhou aquilo ¿ disse Abu Sharif, em Ein al-Hilweh.

Produtos de empresas dinamarquesas estão sendo retirados de lojas de países de maioria muçulmana. A companhia Arlo, de laticínios, disse que suas vendas na região chegaram a zero. Um dos protestos mais polêmicos ocorreu em Londres. Centenas de manifestantes saíram de uma mesquita e foram até as embaixadas de Dinamarca, França e Alemanha. Eles seguravam cartazes com frases como ¿Que a democracia e a liberdade de expressão vão para o inferno¿ e ¿Europa, aprenda as lições do 11 de Setembro¿.

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