Título: POLÍTICA ENERGÉTICA DE BUSH VISTA COM DESDÉM
Autor: José Meirelles
Fonte: O Globo, 05/02/2006, O Mundo, p. 42

Presidente defende busca por combustíveis alternativos, mas aumento da verba para o setor é insignificante

WASHINGTON. A dramática declaração do presidente George W. Bush, dias atrás, admitindo publicamente que ¿os Estados Unidos são viciados em petróleo¿, foi endossada por unanimidade pelos americanos. Mas as sugestões feitas por ele para acabar com tal vício foram recebidas com desdém e até sarcasmo.

É que a maioria das iniciativas anunciadas pelo presidente, incentivando a busca de combustíveis alternativos, é reciclada. Tratam-se de estudos sérios que jamais tiveram apoio suficiente do governo. E os novos recursos anunciados por Bush foram escassos.

Verba para o setor aumenta apenas 20%

A saída apresentada por ele não foi proporcional ao alerta que fizera. Amanhã o presidente enviará ao Congresso Nacional um pedido de US$996 milhões anuais para financiar a busca de novas formas de energia. Isso, porém, significará um aumento inexpressivo sobre os recursos investidos atualmente: pouco mais de US$200 milhões. Isto é: a verba crescerá cerca de apenas 20%.

¿ A declaração ressoou no mundo todo. Mas o que Bush disse sobre o assunto, logo em seguida, foi insignificante. Não há iniciativas sólidas a longo prazo. As soluções oferecidas são limitadas ¿ disse John Coequyt, especialista em energia do grupo ambientalista Greenpeace.

Philip Clapp, presidente do National Environmental Trust, outra ONG do setor, endossou:

¿ Considerando o que ele disse, Bush na prática vai deixar a nossa dependência crescer por mais 20 anos, até que alguma tecnologia milagrosa resolva o problema. A única cura para o tal vício é uma intervenção. E isso significa encarar seriamente a necessidade de aumentar a eficiência do combustível dos carros americanos.

Os EUA produzem hoje seis milhões de barris de petróleo diariamente, mas consomem 20 milhões de barris por dia. Uma proposta de lei apresentada recentemente no Congresso sugere uma economia de 2,5 milhões de barris diários dentro de uma década. Isso é o equivalente ao que os EUA importam do Golfo Pérsico hoje. Isto é: apenas 20% do total consumido pelo país.

¿ A iniciativa apresentada pelo presidente ficou muito aquém daquilo que nós realmente necessitamos: um significativo plano de ação para acabar com a dependência dos EUA ¿ disse Frances Beinecke, presidente do Natural Resources Defense Council.

Segundo ela, Bush fez bem em alertar a população para o problema, mas o grande desafio será conseguir que as tecnologias sonhadas por ele para resolver a questão saiam dos laboratórios e cheguem às ruas. E isso, considerando as providências que ele pretende tomar, poderia demorar duas ou três décadas, pelos cálculos de Beinecke.

Laboratório de energia renovável anuncia demissões

Bush enumerou seis iniciativas: o desenvolvimento de usinas de energia que queimem carvão de uma forma mais limpa; a melhoria da eficiência de células solares; pesquisas sobre a energia do vento; a fabricação de etanol de milho, plantas e lascas de madeira; pesquisas para a produção de células de hidrogênio para abastecer veículos e residências; e a melhoria da eficiência das baterias para carros híbridos.

Um fato irônico derrubou a dramaticidade do anúncio feito por Bush menos de 24 horas depois de seu discurso: o Departamento de Energia anunciou a demissão de pesquisadores justamente do Laboratório Nacional de Energia Renovável. O orçamento do laboratório também sofrerá um corte: cairá de US$202 milhões para US$174 milhões anuais.

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