Título: BRASIL SUSPENDE TODA A IMPORTAÇÃO DE CARNE ARGENTINA
Autor: Eliane Oliveira, Chico O. e Janaína Figueiredo
Fonte: O Globo, 10/02/2006, ECONOMIA, p. 21

Governo diz que embargo devido à febre aftosa favorecerá exportação brasileira. No Sul, controle até no aeroporto

BRASÍLIA, PORTO ALEGRE e BUENOS AIRES. O Ministério da Agricultura decidiu ontem suspender as importações de animais vivos e carnes de toda a Argentina. Na quarta-feira, o ministro Roberto Rodrigues havia determinado o veto apenas aos produtos da província de Corrientes, situada a 280 quilômetros do Rio Grande do Sul, onde foi registrado um foco de febre aftosa. A ampliação da medida tem por objetivo evitar a propagação da doença em território brasileiro. Ao mesmo tempo, pretende impedir que sejam prejudicadas as negociações entre o Brasil e os países que deixaram de importar carne brasileira no fim do ano passado, quando foram registrados focos de aftosa em Mato Grosso do Sul e Paraná.

Para o secretário de Defesa Agropecuária, Gabriel Maciel, o embargo que a Argentina passou a sofrer desde o surgimento da doença em Corrientes ajudará, indiretamente, o Brasil. Ele citou o Chile, a Rússia e a os países da União Européia (UE) como exemplos de clientes que deverão acelerar a liberalização do produto brasileiro.

- Indiretamente, o Brasil será beneficiado. Não há como fugir da questão comercial - disse Maciel.

Representantes do setor privado alertam que a doença em qualquer país do Mercosul afeta a imagem do bloco como um todo.

- Os ganhos são pequenos, se levarmos em conta o prejuízo à imagem do Mercosul - disse o diretor da Associação Brasileira da Indústria Exportadora de Carne (Abiec), Antonio Camardelli.

Pedro Camargo, presidente da Sociedade Rural Brasileira, lembrou que os argentinos chegaram a festejar o surgimento da aftosa em Mato Grosso do Sul, em outubro de 2005.

- Ficamos muito chateados com os argentinos, mas não faremos o mesmo que eles fizeram conosco - complementou Camargo.

Para evitar novos dissabores, a fronteira do Brasil com a Argentina será monitorada por satélite, informou o secretário de Defesa Agropecuária. Segundo ele, isso permitirá um maior controle do trânsito de animais e seus derivados na região.

- Com o surgimento do foco de febre aftosa em Corrientes, vamos dar prioridade à instalação de um sistema para monitorar a área fronteiriça Brasil-Argentina, que vai do Rio Grande do Sul ao Paraná, passando por Santa Catarina - afirmou Maciel.

O Rio Grande do Sul intensificou ontem a vigilância nos 724 quilômetros de fronteira com a Argentina. Os cuidados se estenderam ao Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, onde as pessoas que chegavam da Argentina precisavam passar sobre um pedilúvio, tapete com solução de iodo, para evitar a propagação do vírus.

O secretário de Agricultura do estado, Odacir Klein, vistoriou ontem o posto de fiscalização de Porto Mauá, a 267 quilômetros da cidade argentina de San Luis Del Palmar, onde surgiu o foco de aftosa. Trata-se de uma tradicional rota de comércio entre os dois países, por meio de balsa. Os veículos que chegam do lado argentino recebem um jato de iodo nos pneus, para impedir a eventual propagação do vírus, providência que também foi estendida ontem às demais barreiras.

- Animais e carne não entram. Por isso a preocupação agora é com automóveis e pessoas - disse Klein. Nesta época, milhares de argentinos chegam de férias ao Sul do Brasil e a preocupação é que tragam carne ou produtos de origem animal.

Chile, Israel e África do Sul já embargaram a carne da Argentina

O novo foco na Argentina deve causar grave prejuízo aos produtores rurais do país, que em 2005 exportaram US$1,6 bilhão. Chile, Israel e África do Sul já suspenderam suas importações. Juntos, Chile, Rússia e UE concentram quase 80% das exportações de carne argentina. As restrições aplicadas pelos chilenos provocaram forte preocupação entre os pecuaristas argentinos. Entre 2000 e 2003, a Argentina perdeu cerca de US$500 milhões por ano, pela suspensão de suas exportações de carne.

- Vários mercados se fecharão preventivamente - lamentou o presidente da Sociedade Rural Argentina (SRA), Luciano Miguens, que aproveitou para questionar as restrições às exportações de carne implementadas pelo governo Kirchner para ajudar no combate à inflação.

(*) Correspondente

Legenda da foto: PASSAGEIROS DE vôos internacionais passam por tapete químico, em Porto Alegre