Título: NO RASTRO DA VIOLÊNCIA
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Fonte: O Globo, 13/02/2006, O MUNDO, p. 17

Condoleezza adverte que reação a charges pode sair do controle. Na Cisjordânia, mesquita é pichada

A secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, advertiu ontem que as violentas reações à publicação de charges sobre Maomé podem fugir ao controle se os governos se recusarem a agir com responsabilidade. Ela se referia principalmente a Irã e Síria, que os Estados Unidos acusam de fomentar protestos. Segundo a secretária, o Irã deveria pedir calma a seus cidadãos e não encorajar protestos contra embaixadas ocidentais. ¿ Se governos não agirem responsavelmente, poderemos enfrentar um senso de revolta que fuja ao controle, particularmente se pessoas continuarem a incitar ¿ disse Condoleezza. ¿ É bem conhecido que o Irã e a Síria levam manifestantes às ruas sempre que querem, para mostrar sua posição. A declaração veio num dia em que houve tanto protestos contra ocidentais, quanto contra comunidades islâmicas. Durante a semana, uma série de manifestações violentas deixaram cerca de dez mortos no Afeganistão, além de missões diplomáticas dinamarquesas e ocidentais terem sido alvo de ataques em Síria, Líbano e Irã. Teerã rebateu as acusações de que teria incentivado os protestos dizendo que ¿o que aconteceu foi uma reação natural¿. ¿Rice e os dinamarqueses deveriam se desculpar. Estes comentários podem piorar a situação¿, segundo o Ministério do Exterior. A Dinamarca ¿ país onde as caricaturas foram publicadas primeiro ¿ pediu que seus cidadãos deixem o mais rapidamente possível a Indonésia. ¿Informações concretas indicam que um grupo extremista deseja perseguir dinamarqueses em protesto pela publicação das charges¿, dizia o comunicado do Ministério do Exterior. Segundo o ministério, o perigo maior é no leste de Java, mas a ameaça ¿pode se espalhar pelo restante do país¿. No sábado, o corpo diplomático foi retirado do país e levado temporariamente para local não revelado. A Dinamarca já retirou seu pessoal diplomático também do Irã e da Síria.

Três palestinos são baleados

A questão ateou mais fogo no conflito entre israelenses e palestinos. Uma mesquita da aldeia de Nabi Elias, na Cisjordânia, apareceu pichada com insultos a Maomé, comparando-o a um porco (animal considerado impuro pelos muçulmanos). Soldados israelenses ainda tentaram apagar as pichações, que teriam sido feitas por colonos judeus. Mas centenas de pessoas se reuniram em Nabi Elias, Azun e Punduk, queimando pneus, atirando pedras contra carros e objetos incendiários contra tropas. No confronto, três palestinos foram baleados e uma mulher foi ferida por uma pedra. ¿ Ativistas de direita querem fazer uma fogueira ¿ protestou no Parlamento israelense o deputado árabe Taleb a-Sana, exigindo que o fato seja investigado. Em outro ataque, um cemitério islâmico foi violado em Gravlund, na Península da Jutlândia, Dinamarca. Vinte tumbas tiveram suas lápides pichadas ou destruídas. Em Odense, cerca de cem pessoas se reuniram numa manifestação organizada por movimentos contra a imigração e em apoio ao jornal que publicou as charges. Já no Líbano, o grupo Usbat al-Ansar, ligado à rede terrorista al-Qaeda, disse que incendiar as missões dinamarquesas em Líbano e Síria acenderia uma guerra santa contra o Ocidente. ¿O fogo que vocês acendem nada mais é do que um sinal para os campos de refugiados palestinos contra os cruzados¿, disse o grupo. No Iêmen, as autoridades prenderam três jornalistas e buscam um quarto, depois de fecharem os jornais ¿Yemen Observer¿, ¿al-Hurriya¿ e ¿al-Rai al-Aam¿ por reproduzirem as caricaturas de Maomé. Jornalistas argelinos também denunciaram a prisão de Kahel Boussad e Berkane Bouderbala, editores dos semanários pró-islâmicos ¿Errisala¿ e ¿Iqraa¿, que foram fechados pelo mesmo motivo. As manifestações continuaram ontem, com turcos ultranacionalistas jogando ovos contra a fachada do Consulado da França em Istambul. Mais de 50 mil pessoas se reuniram em Diyarbakir, nas região curda, para protestar contra as charges.