Título: São as nuvens
Autor: Tereza Cruvinel
Fonte: O Globo, 15/02/2006, O PAÍS, p. 2

A resposta do presidente Lula à sua ascensão eleitoral na pesquisa CNT/Sensus será intensificar as ações de governo sem falar em candidatura. A do PT, resistir à tentação do salto alto. A dos tucanos, apressar a escolha do candidato. A pesquisa joga o vento a favor de Lula e pressiona o PSDB a decidir sob a forte impressão criada por um quadro que pode se alterar e talvez contenha elementos de sazonalidade. Lula estava reunido com uma boa constelação de petistas, na tarde de anteontem, quando lhe foi levado o resumo da pesquisa. Estavam com ele, discutindo exatamente os próximos passos, os ministros Dilma Rousseff, Jaques Wagner e Luiz Dulci, o presidente do PT, Ricardo Berzoini, o governador Jorge Viana, o prefeito Marcelo Déda, entre outros. Passada a primeira manifestação de júbilo, foi ele o primeiro a recomendar cautela e salto baixo, informando que agora vai se dedicar a uma intensa agenda de governo. Não quer falar de candidatura, de coordenação de campanha, de alianças, programa de governo e outros assuntos eleitorais. O PT, disse a Berzoini, que vá conversando com os outros partidos e tomando providências políticas. Houve até o momento em que insinuou não ter mesmo, no íntimo, tomado a decisão de se candidatar. Foi logo lembrado que nesta altura não há outra saída. A tal agenda de governo inclui a troca dos ministros que vão sair no final de março e o prosseguimento das viagens internas para inaugurar obras ou lançar projetos. Isso, continuará fazendo, apesar dos estrilos da oposição. O anúncio do resultado da pesquisa animaria mais tarde a festa de aniversário do PT, mas a ordem ontem era conter a euforia. Há muito chão pela frente e uma curva perigosa, o desfecho das CPIs. Mas devem os petistas se acautelar também porque o desempenho de Lula pode mesmo ter sido positivamente afetado por elementos temporais de uma conjuntura que pode se dissipar. Um analista que chama a atenção para a sazonalidade é Alexandre Marinis, da Consultoria Mosaico. Ele acredita que a subida de Lula está relacionada com a queda sazonal do desemprego, ao aumento sazonal da renda e à natural renovação das expectativas da população no início do ano. Some-se a isso o aumento do salário-mínimo, a ausência do candidato anti-Lula e a superexposição recente do presidente anunciando programas como o pacote habitacional e a operação nas estradas. Depois do carnaval, diz ele, a vida volta ao normal, surgem as contas das compras do fim do ano passado e muitos empregos evaporam. Invariavelmente a popularidade dos presidentes sobe no primeiro trimestre do ano e cai no segundo. Para conservar o potencial eleitoral de hoje, Lula terá que continuar produzindo, ao longo dos próximos meses, os sentimentos de satisfação que resultaram em sua espetacular recuperação. A lembrança do escândalo voltará na campanha e será preciso responder mais categoricamente ao que houve. Se o quadro contiver mesmo a contaminação sazonal, o risco maior é do PSDB. Poderá abdicar do candidato hoje mais competitivo, José Serra, por sua conhecida dificuldade de deixar a prefeitura para entrar no "túnel escuro", para usar expressão de FH. Optando agora por Geraldo Alckmin, poderá carimbá-lo como candidato "para perder", à medida que o outro, quando ameaçava Lula, esteve a um passo de ser ungido. Num dia de adrenalina política elevada por conta da pesquisa, o ministro Gilberto Gil, de passagem pelo Congresso, foi direto e simples: - Ora, gente, são as nuvens! Sabemos que elas mudam sempre de forma...