Título: ALGUMA LUZ, ENFIM
Autor: George Vidor
Fonte: O Globo, 20/02/2006, ECONOMIA, p. 15

Enquanto o Brasil tiver déficit nas contas públicos, os juros serão altos. Com a queda da inflação este ano, os juros provavelmente deixarão de ser demasiados altos e recuarão para o patamar dos simplesmente altos. O déficit, por sua vez, tem sido alimentado por esses juros, o que deixa o país em uma enrascada. A economia feita pelo setor público (superávit primário) pouco adiantou.

Haja visto que a relação dívida pública como proporção do Produto Interno Bruto (PIB) anda estacionada em 51,6%. Então para desarmar essa armadilha de fato é preciso alguma solução criativa, sem ferir regras de mercado (calote não vale). Essa solução talvez tenha aparecido com a decisão do Tesouro Nacional, em comum acordo com o Banco Central, de recomprar títulos da dívida pública externa, que atualmente estão entre as preferências dos investidores lá fora. Tais papéis pagam juros altos, se comparados com a média internacional, mesmo considerando-se apenas as chamadas economias emergentes. Então, recolhê-los é uma decisão correta, pois as condições favoráveis do mercado financeiro no momento permitem que o Tesouro lance novos papéis, com juros mais baixos e prazos mais longos para resgate. O governo já tinha decidido renovar, a cada ano, apenas 80% da dívida pública externa à medida que ela fosse vencendo. Essa estratégia foi antecipada, de maneira que não deverá ter mais títulos da dívida externa circulando com vencimento até 2010. E 80% disso serão renovados com a emissão e venda de títulos de mais longo prazo. Ora, quem quiser manter em carteira no exterior a mesma posição percentual de papéis do Brasil ¿ e estes, de toda forma, continuarão muito rentáveis, com rendimentos ainda bem superiores à média do mercado ¿ terá que comprá-los também aqui, internamente. Se comprarem, pagando em dólares, não pagarão Imposto de Renda sobre os rendimentos que auferirem. Para o Tesouro, essa receita em moeda estrangeira facilitará o resgate da dívida pública externa, livrando o país de um problema que nos atormenta há décadas. Pela lei da oferta e da procura, esse interesse de investidores estrangeiros, mesmo que represente uma pequena parcela da dívida interna, pode desencadear uma onda favorável à redução dos juros domésticos. Se isso de fato ocorrer ¿ e tudo leva a crer que ocorrerá ¿ os juros deixarão de alimentar o déficit público, e aí finalmente poderemos descer mais alguns degraus da escala, caindo primeiro para taxas moderadamente altas até chegar à categoria dos juros civilizados, considerando-se como tal a média do mercado internacional. Os fracos resultados da economia brasileira no ano passado balançaram as convicções dos mais inveterados otimistas. Mas com essa decisão do Tesouro, apoiada pelo BC (!!!), pode-se dizer que começamos bem 2006. E por trás de tudo isso mais uma vez está o excelente desempenho das exportações brasileiras. A compra de dólares para o resgate da dívida pública externa evitará grande oscilação no câmbio e a indesejável apreciação continuada do real.

A BR, distribuidora de combustíveis da Petrobras, resolveu entrar no ramo da energia elétrica, adquirindo participação de 49% em 13 pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) a serem construídas, e deixou todo mundo com a pulga atrás da orelha. Qual a relação da distribuição de combustíveis com a energia elétrica? Rodolpho Landim, presidente da BR, explica que cerca de 45% do faturamento da empresa são provenientes dos postos de serviços, e os demais 55% de outros nichos de mercado, entre os quais médios e grandes consumidores de combustíveis que no futuro só se manterão fiéis à distribuidora se ela conseguir oferecer novos serviços. E a energia elétrica seria uma dessas possibilidades. As 13 PCHs terão potência de 300 megawatts no total, quase o equivalente à metade de Angra 1. Se a BR tiver êxito com essa experiência, poderá se aventurar mais no ramo das pequenas centrais hidrelétricas. Não deixa de ser uma iniciativa bem inovadora, tratando-se de uma distribuidora de combustíveis.

O gasoduto que ligará, quem sabe um dia, o campo de Urucu, no Amazonas, a Porto Velho, deveria ter ficado pronto em 2003, mas a obra sequer começou pois a toda hora surge uma novidade que o impede de sair do papel. O duto será explorado por uma empresa formada em sociedade, meio a meio, da Petrobras com capitais privados. O próprio Ibama concluiu que o duto causará menos impacto ambiental mantendo seu trajeto original, com 65 quilômetros passando por uma floresta nacional (criada depois de o projeto ter sido aprovado), do que se for feito algum desvio. O impacto, na verdade, ocorre na fase de assentamento dos dutos, quando mil hectares de árvores e vegetação precisam de cortados (a floresta tem 833 mil hectares). Depois, a vegetação volta a encobrir o gasoduto. O mais curioso é que, sem o gás, as térmicas de Rondônia e do Acre ficam queimando milhões de litros de óleo diesel, que, em certos meses do ano, são transportados de caminhão, da refinaria de Paulínia, em São Paulo, até lá. E quem paga parte dessa conta são os consumidores de energia elétrica de todo o país. Haja bom senso...