Título: REALIDADE E PROMESSA
Autor: Merval Pereira
Fonte: O Globo, 19/02/2006, O PAÍS, p. 4

Há razões objetivas para que a cúpula do PSDB tenha se convencido de que o nome do prefeito de São Paulo, José Serra, é o mais viável para disputar com Lula a Presidência da República: um balanço consolidado de todas as pesquisas já realizadas ¿ Ibope, Datafolha e Sensus, com exceção dessa última, divulgada no início da semana, e algumas séries vindas desde 2004 ¿ define o que os técnicos chamam de ¿estruturas de competição¿, para além dos números puros.

A curva dos três candidatos mais competitivos contra Lula mostra claramente que Serra se mantém como o mais forte deles, com uma média de 54 pontos, e com uma curva ascendente. O governador Geraldo Alckmin tem uma média de 45 pontos, e o ex-governador do Rio Garotinho tem 40 pontos, sendo que a linha dos dois é semelhante, mais ou menos plana, sem grandes altos e baixos. Nessa longa série, Lula começa em dezembro de 2004 com pouco mais de 40 pontos e hoje estaria logo abaixo de 35. Serra começou abaixo de 30 e hoje está na casa dos 35. Já contra Alckmin, Lula começa mais acima, na casa dos 45 pontos e hoje estaria também perto dos 35 pontos. O governador de São Paulo começou abaixo de 15 e hoje está na casa dos 20 pontos. Isso quer dizer que cerca de 70% dos votos em disputa estão praticamente divididos entre Lula e Serra, mesmo que o viés de alta no momento seja de Lula. Serra é um candidato consolidado em cerca de dois anos de pesquisas, enquanto Alckmin é potencialmente capaz de se transformar em vencedor. Uma decisão por Alckmin significaria uma aposta no futuro, que pode se concretizar ou não. A consolidação das pesquisas indica que existe a possibilidade de Alckmin permanecer no mesmo patamar atual, com risco de perder o segundo turno para Garotinho, que transita no mesmo índice de aprovação, embora atinja outro eleitorado. Ou, no limite, favorecer uma vitória de Lula no primeiro turno. Há, no entanto, um consenso entre os analistas de pesquisas de opinião: a performance do governador Alckmin, com um patamar de 20% de intenção de votos, é fato inédito nas campanhas eleitorais para o início de uma primeira candidatura. O risco de Serra abrir mão da Prefeitura e não se eleger Presidente existe, o que significaria ¿um risco impensável¿ para o PSDB paulista, na definição de um ¿alquimista¿. O PSDB, se não conseguir eleger o sucessor do governador, simplesmente desaparecerá do mapa político paulista se Serra e Alckmin abrirem mão de seus cargos simultaneamente. Por isso, a melhor solução, para os serristas, seria o governador Alckmin não apenas desistir da candidatura, como permanecer no governo até o final do mandato, para comandar a campanha para sua sucessão e ajudar na campanha presidencial. Essa solução ideal, no entanto, está longe de ser alcançada nas atuais circunstâncias. Mas não apenas de números vivem os tucanos, e muito menos Alckmin, que quer incluir nas análises questões mais subjetivas. O cientista político Antonio Lavareda está fazendo também pesquisas qualitativas, que ainda não foram completamente analisadas. Ele as dividiu em três etapas: a parte econômica, para saber quem é mais capaz de gerar empregos, de fazer o país crescer, a da ética e a do social. Os resultados preliminares, que já foram mostrados a alguns tucanos, mostram que a percepção dos consultados é de que PT e PSDB não se diferenciam muito nas questões econômicas, o que indicaria a necessidade de apresentar um programa econômico diferenciado do que está sendo aplicado pelo governo Lula, projetando crescimento para o futuro. Talvez por isso, na reunião que teve com economistas tucanos na Casa das Garças no Rio, na tarde de sexta-feira, o governador Geraldo Alckmin estava interessado menos em discutir juros e câmbio, e mais projetos de crescimento da economia. No capítulo ético, Lula paga o preço dos escândalos, as pessoas se mostram decepcionadas, e o PSDB se destaca positivamente. É no terceiro capítulo, que trata do social, que Lula tem um patrimônio forte, e os candidatos do PSDB têm prós e contras. O perfil mais tecnocrático de Serra seria compensado pelas boas lembranças que deixou à frente do Ministério da Saúde. O fato de Geraldo Alckmin ser médico (é anestesista) pega bem junto ao povo. Mas nenhum dos dois parece ser páreo para Lula nesse quesito. O resultado completo das pesquisas qualitativas, no entanto, ainda será apresentado à ¿Santíssima Trindade¿. O ex-presidente Fernando Henrique é dos mais interessados nas qualitativas que, para ele, podem apresentar soluções e caminhos que não são expressos apenas nos números. Estão sendo examinadas também as combinações de candidaturas, especialmente as que têm potencial de retirar votos de Lula. O pré-candidato Garotinho continua sua campanha pelo país e na sexta-feira esteve em São Luís, sendo apoiado por nada menos que o grupo político do senador José Sarney, que, no entanto, continua atuando para que o PMDB não tenha candidato próprio e apóie Lula. Garotinho tem uma visão otimista sobre o processo eleitoral interno do PMDB, considerando que sairá vitorioso na maioria dos estados, mas com força especial nos três colégios eleitorais que têm mais peso, São Paulo (18%), Rio (13%) e Minas (12%). Desses, apenas em São Paulo ele espera alguma dificuldade, em vista da atuação forte do presidente regional do partido, Orestes Quércia, a favor da candidatura Rigotto. Mesmo assim, espera pelo menos garantir metade dos convencionais paulistas, contra 75% em Minas e 90% no Rio. Tanto Garotinho quanto os tucanos estão certos de que hoje Lula está à frente, mas não com a diferença de 10 pontos sobre Serra que apareceu na última pesquisa Sensus. Para Garotinho, quando as demais candidaturas se apresentarem, Lula desinflará, e a percepção de decadência ficará amplificada, por ele estar na Presidência e, no momento, à frente das pesquisas. A melhor combinação para o PSDB é a que junta Garotinho pelo PMDB, a senadora Heloisa Helena, pelo PSOL ou por uma coligação de partidos de esquerda não-petista, e Serra pelo PSDB. Nessa simulação, Lula tem seu pior resultado.