Título: ESTADO ASSISTENCIAL
Autor:
Fonte: O Globo, 19/02/2006, OPINIÃO, p. 6

Atendência de político em campanha eleitoral é acenar com o máximo de promessas e evitar temas que levantem a suspeita de que o futuro pode não ser risonho e franco. Esse antigo cacoete se repetirá em 2006, com o agravante de Luiz Inácio Lula da Silva, candidato à reeleição, ter uma faceta populista, do ponto de vista fiscal do seu governo, a ostentar ¿ compensada, é verdade, por uma ação firme na política monetária conduzida pelo Banco Central. Dos palanques, Lula acenará com os aumentos reais concedidos ao salário-mínimo ¿ omitindo, é claro, o impacto desastroso nas contas públicas ¿ e os bilhões destinados ao Bolsa Família, uma forma de dizer que se continuar no Planalto fará ainda mais. Se a disputa se resumir a um campeonato entre generosidades irreais com o dinheiro do Tesouro Nacional, as eleições de 2006 serão uma oportunidade perdida para se discutir a sério o futuro do país, principalmente a política de gastos públicos. Que não terá vida longa, diga-se, a não ser que volte a inflação. É evidente que não se pode estender durante muito tempo uma política de gastos crescentes, à custa do aumento da carga tributária e do corte dos investimentos. Afinal, ao chegar aos 37% do PIB ¿ índice de país de Primeiro Mundo, de alta renda ¿ o peso dos impostos converteu-se em estímulo à ágil indústria da sonegação; enquanto os investimentos, na faixa de 0,5% do PIB, sequer são suficientes para manter estradas. Na verdade, embora adversários, tucanos e petistas têm em comum a responsabilidade pelo crescimento excessivo dos gastos correntes primários (exceto juros da dívida). Essa prática, iniciada com Fernando Henrique Cardoso, foi mantida e até radicalizada por Luiz Inácio Lula da Silva. Em dez anos, calcula o economista Raul Velloso, essas despesas primárias deram um salto de 77% acima da inflação. A velocidade dos gastos é superior à da expansão do PIB ¿ outro sinal da insustentabilidade da política. Seja Lula ou quem for, o próximo presidente, queira ou não, terá de desarmar essa bomba fiscal. Ou seja, reformar a Previdência e rever os bilhões injetados sem maiores controles em programas sociais. O Estado brasileiro está cada vez mais próximo de ser apenas uma enorme e dispendiosa máquina assistencialista, incapaz de estimular o desenvolvimento.