Título: INVESTIMENTOS EM ÁLCOOL A PLENO VAPOR
Autor: Luciana Rodrigues e Vladimir Goitia
Fonte: O Globo, 19/02/2006, ECONOMIA, p. 36

Demanda crescente leva à construção de 89 usinas nos próximos cinco anos, num valor total de US$10 bilhões

RIO e SÃO PAULO. O avanço dos carros flex, o interesse dos estrangeiros pelo álcool brasileiro e a disparada nos preços internacionais do açúcar levaram à multiplicação dos investimentos em usinas no Brasil. Levantamento da União da Agroindústria Canavieira de São Paulo (Unica) mostra que pelo menos 89 novas fábricas devem entrar em operação nos próximos cinco anos, num investimento total de US$10 bilhões. Só em 2005, o BNDES desembolsou R$1,15 bilhão para o setor, volume que deve dobrar este ano. A maioria dos novos projetos fica no estado de São Paulo. A região de Araçatuba é considerada a capital do gado no Brasil, mas está sendo invadida pela cana-de-açúcar. Em alguns municípios, como Fernandópolis, o preço da terra dobrou nos últimos três anos. A procura por máquinas para ampliar a produção das usinas é tão grande que já há equipamentos que precisam ser encomendados com um ano de antecedência.

Novos projetos não serão suficientes para demanda

Mas nem mesmo as novas usinas ¿ segundo a Unica, 25 serão inauguradas no ano que vem ¿ e a ampliação das já existentes conseguirão atender à demanda crescente. Ou seja, os preços do álcool devem continuar sob pressão. ¿ O que estamos produzindo e o que produziremos será insuficiente para uma demanda projetada de 27 bilhões a 30 bilhões de litros de álcool em 2010 ¿ diz Maurílio Biagi Filho, presidente da usina Moema e conselheiro da Unica. No Oeste paulista, serão 34 novos projetos que, juntos, representam US$3 bilhões em investimentos. E as 44 usinas já existentes na região devem ser ampliadas e modernizadas. ¿ A maioria dará prioridade ao álcool. É muito mais negócio e custa menos produzir. Mesmo com o dólar a R$2, o setor continuará competitivo ¿ diz Luiz Guilherme Zancaner, presidente da Usinas e Destilarias do Oeste Paulista (Udop). A Açúcar Guarani, que já tem duas usinas processando 6 milhões de toneladas de cana-de-açúcar por ano, vai construir uma nova unidade integralmente destinada à produção de álcool a partir da safra 2008/2009. Será mais um milhão de toneladas. A empresa, que no passado destinava 80% de sua produção para o açúcar e 20% para o álcool, já aumentou a parcela de etanol para 30%. ¿ A cotação do açúcar está no maior patamar em 25 anos, mas isso é temporário. O álcool é o mercado mais promissor ¿ afirma o diretor-financeiro da empresa, Alberto Klumb. O superintendente da Área de Indústria do BNDES, Carlos Gastaldoni, destaca que os estrangeiros viram no álcool brasileiro uma energia barata e renovável. Para ele, o mercado externo vai crescer de forma explosiva, pois muitos países já estão adicionando etanol à gasolina.

Fábrica de higiene e limpeza investe em álcool no Rio

Até 2002, o Brasil exportava entre 200 milhões e 500 milhões de litros de álcool por ano. Na safra 2004/2005, foram 2,58 bilhões de litros, que geraram US$584,49 bilhões em divisas. O país é o maior produtor e exportador mundial. ¿ O Brasil tem o domínio tecnológico de toda a cadeia, desde a agricultura, passando pela indústria e os motores de automóveis. O custo de produção aqui é menor e há terra disponível ¿ diz Gastaldoni.

Prova do interesse pelo setor é o sucesso da brasileira Cosan, maior empresa de açúcar e álcool do mundo, que lançou ações em bolsa em novembro de 2005. Desde então, seus papéis subiram mais de 130%. Antônio de Pádua Rodrigues, diretor-técnico da Unica, destaca que entre os novos investidores há algumas distribuidoras de combustíveis que nunca haviam produzido álcool. No Rio de Janeiro, o grupo Alóes&Alóes, que fabrica produtos de higiene e limpeza, vai construir uma usina na região de Campos, num investimento de R$300 milhões. Segundo Wagner Freire, consultor da Alóes&Alóes, a empresa decidiu pelo Rio porque o estado é grande consumidor de álcool, mas importa do resto do Brasil mais de 90% de sua demanda. O secretário estadual de Agricultura, Christino Áureo, afirma que há três outras empresas interessadas em instalar usinas em Campos.