Título: ALTA DOS PREÇOS DO ÁLCOOL LEVA GOVERNO A FISCALIZAR O SETOR
Autor:
Fonte: O Globo, 04/03/2006, Economia, p. 21

BRASÍLIA. Os sucessivos reajustes nos preços do álcool ¿ que começaram nas usinas, passaram pelas distribuidoras e, agora, atingem em cheio o consumidor nos postos ¿ deixaram em estado de alerta os órgãos de defesa da concorrência do governo. Técnicos do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) e das secretarias de Acompanhamento Econômico (Seae), do Ministério da Fazenda, e de Direito Econômico (SDE), do Ministério da Justiça, estão observando atentamente os procedimentos do setor e podem abrir processos administrativos caso confirmem a existência de indícios de cartelização (formação combinada de preços).

As equipes técnicas estão avaliando toda a cadeia produtiva do álcool. Estão examinando, por exemplo, se os reajustes promovidos pelos produtores no preço de venda do atacado obedecem a datas e percentuais semelhantes, apesar da produção e da comercialização individuais. E também se o aumento nos postos está seguindo um mesmo padrão nas diversas regiões.

A fiscalização se deve ao fato de o governo temer que a situação se agrave. Mesmo reduzindo de 25% para 20% a mistura de álcool anidro à gasolina, para aumentar a oferta de álcool hidratado (vendido diretamente nas bombas), e baixando de 20% para zero a tarifa de importação do combustível, os aumentos de preços se intensificaram. As medidas foram tomadas como reação ao descumprimento, por parte dos usineiros, de um acordo firmado em janeiro que fixava em R$1,05 o litro de álcool.

Se forem instaurados processos administrativos, os casos receberão pareceres da Seae e da SDE, e serão julgados pelo Cade. Havendo comprovação de crime contra a ordem econômica, a legislação em vigor prevê, entre outras punições, multa de 1% a 30% sobre o faturamento que a empresa registrou no ano anterior.

Os usineiros alegam pressão de demanda exercida, principalmente, pelo aumento das vendas de carros bicombustível (que funcionam a álcool e a gasolina). Argumentam que o período atual é de entressafra, quando, tradicionalmente, o produto fica escasso no mercado. Pedem dinheiro para o financiamento de estoques e prometem antecipar em algumas semanas a colheita da safra, originalmente prevista para maio.

Segundo especialistas, o problema é mundial: faltam açúcar e álcool no mercado externo há dois anos, devido a quebras de safras em países produtores, especialmente na Índia. Somente no mês passado, a cotação do açúcar subiu cerca de 80% frente a fevereiro de 2005. O preço do etanol aumentou em torno de 22% no período.

¿ As medidas que foram tomadas vão apenas mitigar um problema global, que é a escassez de açúcar no mundo. Em 2005, o problema se agravou, porque a safra de cana-de-açúcar brasileira cresceu apenas 3%, enquanto o esperado era, pelo menos, 4,5% a 5% ¿ disse o economista Fábio Silveira, da RC Consultores.