Título: VILA NA CARONA DE CHÁVEZ
Autor: Carla Rocha
Fonte: O Globo, 03/03/2006, RIO, p. 12

Escola é notícia pelo mundo por causa do patrocínio do governo venezuelano

A repercussão da vitória da Unidos de Vila Isabel foi longe. Ontem, as edições eletrônicas dos principais jornais dos Estados Unidos, da Inglaterra e da Venezuela noticiaram a conquista do título de campeã do Grupo Especial pela azul-e-branca, com o enredo "Soy loco por ti América". A maioria das reportagens destaca o fato de a escola de samba ter recebido dinheiro da estatal de petróleo da Venezuela, o que já está gerando polêmica e alguma dor de cabeça para o presidente Hugo Chávez. A oposição denunciou ontem o presidente Chávez por uso irregular de verbas públicas - oficialmente seriam US$450 mil - no financiamento de uma escola de samba do Rio. Traduzindo o enredo para "I'm mad about you América", as reportagens na internet da rede de TV ABCnews e do "New York Times", um dos mais influentes jornais americanos, ressaltam que a mensagem da Vila Isabel enaltece a união da América Latina, mas deixa claro o repúdio à influência dos EUA. Também ironizam o fato de Chávez liderar uma campanha contra o presidente americano Geoge W. Bush e a Vila ter levado para a Sapucaí uma alegoria de um dos maiores ídolos do venezuelano, o revolucionário Simon Bolívar, segurando um coração em vez da tradicional espada. Para seus críticos, salientam as reportagens, Chávez está fazendo propaganda de sua política de governo.

Jornal inglês vê politização da festa

Com boa dose do tradicional humor inglês, o "The Guardian", a pretexto de anunciar o resultado do carnaval 2006, fez uma reportagem especial, cujo título em português quer dizer algo como "políticos sambam na batida do carnaval do Rio". Além de mencionar que a Vila foi patrocinada por Chávez, aproveitou para alfinetar Anthony Garotinho, acrescentando que ele foi tema de seis escolas de samba em Campos. Assinado pelo correspondente do jornal no Rio, Tom Phillips, o artigo chama a atenção para a politização do carnaval num ano eleitoral. Em Caracas, capital da Venezuela, que está no centro da polêmica, o debate foi ainda mais intenso. De acordo com a EFE, agência de notícias espanhola, houve um comentarista, entre os muitos profissionais de rádio e de TV que discutiram a questão, que teria chegado a sugerir que, no ano que vem, a Força Armada Nacional (FAN) patrocinasse outra escola de samba em troca de um lugar no desfile para militares de tanga. Outro ponto de discórdia era o valor exato do patrocínio. Na Venezuela, especula-se que o valor pode ter chegado a US$2 milhões. Ontem, o matutino "2001" trazia a manchete "Carro de Bolívar ganhou no Rio", ilustrada por uma foto do desfile no Sambódromo. Mais ou menos o que fez o diário "Vea". Já a contracapa do "El Nuevo País" trazia o título "Bolívar com plumas premiado no Rio". O jornal "El Nacional" mostrou torcedores da Vila comemorando. Ontem, o embaixador da Venezuela, Júlio Garcia Montoya, disse que o governo de Chávez está muito satisfeito com o triunfo da Vila Isabel. Ele negou, no entanto, que o presidente venezuelano viria ao país para o Desfile das Campeãs, no sábado. "Nosso governo acha que foi o triunfo da idéia de integração da América Latina", disse, em nota oficial. A agência italiana Ansa informou que Chávez terá que dar explicações à população sobre o uso do dinheiro da petrolífera PDVSA, que já esteve envolvida em escândalos. Um dos líderes oposicionistas do país, Oscar Arnal, presidente da associação civil Movimento Democrático, pediu que o caso seja investigado pelo procurador-geral da República, Isaías Rodríguez. Segundo Arnal, além de não ter trazido qualquer benefício para os venezuelanos, a iniciativa ainda ridicularizou Simon Bolívar.