Título: Beleza e popularidade
Autor: Deborah Berlinck
Fonte: O Globo, 05/03/2006, O Mundo, p. 35

PARIS. A ascensão quase meteórica desta mulher bonita e sorridente pegou a velha guarda do Partido Socialista (PS) de surpresa. Inicialmente, ela virou alvo de chacota dentro do próprio partido. Perguntava-se se ela ia consultar o marido ¿ o secretário-geral do PS, François Hollande ¿- sobre sua candidatura. Comentários machistas do tipo ¿este não é um concurso de beleza¿ ou ¿quem cuidará dos filhos?¿ abundaram. E quanto mais ela era levada na brincadeira, mais sua popularidade aumentava.

Pois hoje o PS ¿ em crise de identidade desde que foi derrotado pela direita depois mais de dez anos no poder na França ¿ se vê diante da única pessoa que pode levantar o partido. Ségolène Royal, de 52 anos, advogada, política hábil e várias vezes ministra (Educação, Ensino Escolar e Família), virou um fenômeno na cena política francesa. Nas sondagens, ela deixa para trás os pesos-pesados do partido que sonham com a Presidência: Laurent Fabius, Dominique Strauss-Kahn, Jack Lang e seu próprio companheiro.

Ela nasceu numa família com oito crianças, num vilarejo em Vosges. O pai era militar, a mãe, dona-de-casa. Daniel Bernard, jornalista da revista ¿Marianne¿, conta na primeira biografia sobre ela que Ségolène teve uma infância calma e refugiou-se nos livros. Até chegar, aos 15 anos, ao internato no colégio Notre-Dame d¿Epinal. Sua vida deu uma virada. Ségolène estudou ciência política e entrou para a escola da elite governante da França, a École Nationale d¿Administration (ENA).

Foi lá que ela conheceu François Hollande, com quem teve quatro filhos e nunca se casou. Ségolène joga com o charme da sua imagem de mãe, independente, para conquistar o coração dos franceses. Em 2004 foi eleita presidente da região Poitou-Charentes. E desde então, não pára de crescer.

No plano das idéias, ela joga a carta da cautela. Discreta, não faz declarações bombásticas. Numa entrevista ao jornal ¿Financial Times¿, ela diz que não vai se furtar a falar sobre qualquer assunto ¿como as 35 horas, por exemplo¿. Com isso, deixou no ar um tema quase tabu na França: a lei que limita em 35 horas por semana o trabalho dos franceses. Um político que defende o fim desta lei pode perder eleições na França.

¿Ségolène Royal joga várias cartas: personalidade socialista num primeiro plano, companheira de François Hollande e presidenciável na corrida para 2007. Mas a roupa de presidente da República é do seu tamanho?¿, pergunta o jornal ¿Le Monde¿, num artigo sobre a biografia de Ségolène escrita por Bernard.

Em setembro, ela vai decidir quem ¿ ela ou seu companheiro ¿ lançará o nome na disputa da candidatura do PS. Enquanto isso, ela se prepara.

Em janeiro, inaugurou um site internet sob o nome Desejos de um futuro, que tem 13 fóruns de debate sobre temas variados, de cinema a cidadania. Para especialistas, três fatores contribuem para a ascensão de Royal: o fato de ser mulher, sua distância em relação às brigas internas do partido, e a falta de um líder incontestável no Partido Socialista.