Título: EDUCAÇÃO E COTAS
Autor:
Fonte: O Globo, 09/03/2006, Opinião, p. 6

Mais problemas

Numa demonstração de grande capacidade de pressão e mobilização, alguns dos chamados movimentos sociais quase conseguiram, com o apoio do governo, que um projeto de cotas para as universidades federais seguisse da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados diretamente para o Senado. Como essa tramitação acelerada, prevista em regimento, não é indicada para temas muito controvertidos, o presidente da Casa, Aldo Rebelo, a pedido do PSDB e do PFL, decidiu, com acerto, remeter o assunto para o plenário.

Ali será de extrema importância haver um debate sério sobre o projeto, pois estará em jogo a possibilidade de o Brasil ser ou não uma economia mais competitiva mundialmente e de fato mais justa socialmente. Afinal, seus principais concorrentes no mundo globalizado, como a Índia e a China, dedicam especial atenção à qualidade na formação de seus profissionais, especialmente em ciências e áreas técnicas em geral.

Ao se instituir uma reserva de 50% das vagas nas universidades federais para estudantes de escolas públicas, e criar uma subcota para negros e índios, atropela-se a lógica de qualquer sistema educacional eficiente, baseada no mérito e na competência pessoais.

Vender a idéia de que com uma canetada se resolverá as desigualdades sociais pode ser conveniente para políticos em campanha. Mas não interessa ao país. Em vez disso, o governo deveria rever prioridades para fazer uma verdadeira revolução no ensino básico, sem o que o estudante da escola pública, de qualquer cor e nível de renda, jamais conseguirá ser um bom profissional. Mesmo que lhe dêem o diploma. Mais tarde, o próprio mercado de trabalho tratará de alijá-lo.

É falsa a premissa de que a matrícula forçada na universidade de pobres mal formados no ensino básico irá atenuar os problemas sociais. Não irá. Poderá até mesmo agravá-los, na medida em que uma economia pouco competitiva, por contar com uma mão-de-obra menos qualificada, gerará uma quantidade de empregos insuficiente e pagará salários nada atraentes.