Título: Rio, cidade fechada
Autor: Cristiane de Cássia
Fonte: O Globo, 09/03/2006, Rio, p. 13

OExército ampliou o cerco para recuperar as armas roubadas de um quartel na semana passada. Além de ocupar as favelas, agora os militares fazem bloqueios por terra e mar para tentar impedir a saída do armamento da cidade. Segundo o Comando Militar do Leste, os setores de inteligência do Exército e da Secretaria de Segurança receberam informações de que as armas iam ser retiradas do Rio ontem. Por isto, desde o início da manhã, militares e policiais rodoviários federais montaram bloqueios em quatro estradas e uma lancha da Polícia Federal com soldados do Exército começou a patrulhar a Baía de Guanabara. Nada foi encontrado nessas revistas, que continuarão por indeterminado. O efetivo do Exército aumentou ontem de 1.500 para 1.600 homens.

O bloqueio nas estradas, que ganhou o nome de Operação Cerco Total Metropolitano, começou às 5h na Ponte Rio-Niterói. Quinze militares e 25 patrulheiros da Polícia Rodoviária Federal montaram uma blitz na saída para Niterói. Enquanto os patrulheiros vistoriavam documentos, os militares procuravam armas em ônibus, vans, carros e caminhões.

Operação engarrafa a Rio-Petrópolis

Na Rodovia Washington Luiz (Rio-Petrópolis), a operação causou congestionamento de seis quilômetros pela manhã no sentido Rio. Trinta e seis soldados, além de patrulheiros, revistavam veículos na altura do Km 109, no bairro Figueira, em Caxias. Na Via Dutra, a blitz acontecia na altura de Paracambi, nos dois sentidos. Na Rio-Santos, 25 soldados e 11 patrulheiros rodoviários fiscalizavam o tráfego na altura de Itaguaí.

Vinte soldados do 15º Regimento de Cavalaria Mecanizada, apoiados por policiais rodoviários, ocuparam ontem o Km 217 da Via Dutra, em Paracambi, no fim da descida da Serra das Araras, revistando veículos à procura dos fuzis e da pistola levados de um quartel do Exército em São Cristóvão, no Rio. Estranhamente, o bloqueio foi feito na pista São Paulo-Rio, quando a informação era a de que o Exército criou bloqueios na Ponte Rio-Niterói e na Rio-Petrópolis para impedir a saída das armas do Rio.

¿ Nossa missão é controlar a entrada de veículos no Rio. A operação faz parte do plano de busca das armas ¿ disse o tenente Daniel Braga, que comandava a operação.

Segundo a Polícia Rodoviária Federal, a operação pode ser ampliada para outras rodovias. A Baía de Guanabara também virou cenário de busca pelas armas roubadas. Soldados do Exército e policiais federais utilizaram durante o dia de ontem uma lancha Spirit, totalmente blindada, do Núcleo Especial de Polícia Marítima (Nepom) da Polícia Federal para fazer o cerco por mar. Na noite de ontem e madrugada de hoje, a intenção da Polícia Federal era empregar mais uma lancha semelhante e uma embarcação do tipo voadeira.

A lancha, com equipamento de visão infravermelha e modernos sistemas de comunicação, saiu pela primeira vez no início da manhã de ontem com quatro policiais federais e oito soldados. A embarcação voltou às 12h para troca dos tripulantes e retornou ao patrulhamento uma hora e meia depois. Foram percorridos trechos da Baía perto de favelas da Ilha do Governador e do Complexo da Maré. Devido ao assoreamento, alguns locais não podem ser percorridos.

Segundo o Comando Militar do Leste, tropas de Goiânia, Brasília e Belo Horizonte estão de prontidão para vir ao Rio a qualquer momento. Um grupo de Juiz de Fora (MG) teria chegado ontem a Petrópolis para ficar mais próximo do Rio.

A ocupação de favelas pelo Exército em busca das armas roubadas também chegou ontem à Zona Oeste do Rio. No início da manhã, cerca de 300 homens com quatro helicópteros, dez veículos blindados, vários jipes e caminhões ocuparam a Favela da Metral, em Vila Kennedy, e seus acessos pela Avenida Brasil. O movimento dos militares na região não influenciou a vida dos moradores. O comércio e as escolas permaneceram abertos. As pessoas circulavam normalmente.

Os panfletos solicitando a colaboração de moradores para apontar o esconderijo das armas foram distribuídos entre os comerciantes. No dia anterior, na Mangueira e em outros pontos, os mesmos folhetos eram entregues a moradores, mas a maioria tinha receio de pegar.

No fim da manhã, metade do efetivo que ocupou a Favela da Metral deixou a comunidade. Naquele momento, uma cena chamou a atenção de quem passava pela Avenida Brasil. Um dos veículos, um Urutu que sofreu uma pane, teve de ser rebocado pela via por um reboque comum até Santa Cruz, onde um caminhão do Exército o resgatou.

Munição e armas são apreendidas

Ainda pela manhã, os militares fizeram apreensões na Favela da Metral: radiotransmissores e uma bolsa com dinamite deixada numa rua. Mais tarde, com policiais do 14º BPM (Bangu), eles recolheram dois coletes à prova de balas, uma granada, uma pistola e munição de vários calibres. Já no Morro da Providência, no Centro, uma metralhadora Uzi foi recolhida. Todo o material foi encaminhado à Delegacia de Repressão a Armas e Explosivos.

Os militares deixaram ontem as favelas Vila dos Pinheiros, no Complexo da Maré, e Parque Alegria, no Caju. Além das ocupações na Metral e na Providência, foram mantidas as tropas que estavam na Mangueira, Manguinhos, Dendê (Ilha do Governador), Dique (Jardim América), Complexo do Alemão e Jacarezinho.