Título: `Vamos presenciar uma mudança cultural¿
Autor: Janaina Figueiredo
Fonte: O Globo, 11/03/2006, O Mundo, p. 34

O veterano líder democrata-cristão Andrés Zaldívar diz que país terá igualdade total entre homens e mulheres

Aos 69 anos, o veterano dirigente da Democracia Cristã chilena Andrés Zaldívar prepara-se para assumir o comando do Ministério do Interior, um dos cargos mais importantes do governo de seu país. Zaldívar, braço direito da presidente Michelle Bachelet, será uma espécie de vice-presidente (cargo que não existe no Chile), já que na ausência da presidente o ministro do Interior assumirá o comando. ¿Vamos presenciar uma mudança cultural muito importante, não somente no âmbito público, mas também nas empresas privadas e nas famílias chilenas¿, disse o futuro ministro em entrevista ao GLOBO, em seu escritório localizado no centro de Santiago.

Alguns analistas consideram que sua designação buscou tranqüilizar a direita...

ANDRÉS ZALDÍVAR: Sou da Democracia Cristã e isso ajuda a equilibrar a coalizão de governo. Fui o ministro mais novo do governo de Frei Montalva (1964-1970) e sou o ministro mais velho do Gabinete de Michelle Bachelet (risos).

Qual será o estilo deste governo?

ZALDÍVAR: O que ela (Bachelet) fez questão de reafirmar em nossas reuniões de ministros foi o estilo cidadão. Ela quer um governo que abra as portas para o povo. A instrução dada aos ministros e secretários foi de criar espaços de participação para a população. Uma primeira medida foi não repetir nomes na designação dos novos funcionários. Neste caso, eu sou uma exceção. Nenhum dos ministros do governo Lagos será mantido, ela não quer cadeiras giratórias. Quer caras novas, gente jovem, uma mudança de geração. A igualdade total entre homens e mulheres é outra das regras básicas do novo governo, uma regra que vai provocar mudanças profundas em nosso país. Será uma igualdade profunda, em todos os níveis do governo.

A chegada de Bachelet ao poder representa uma revolução cultural para o Chile?

ZALDÍVAR: Sim, acho que vamos presenciar uma mudança cultural muito importante, não somente no âmbito público, mas também nas empresas privadas e nas famílias chilenas. As mulheres se sentirão mais fortalecidas, pois serão eliminadas todas as barreiras de discriminação.

Estamos falando do mesmo país que somente em 2004 aprovou a Lei de Divórcio...

ZALDÍVAR: Sim, mas a verdade é que as pessoas se separavam mesmo sem a Lei de Divórcio (risos).

A transição chilena começou em 1990, com o ex-ditador Augusto Pinochet à frente do Exército. Qual é o peso do general Pinochet hoje na política chilena?

ZALDÍVAR: Hoje Pinochet está reafirmando a transição democrática, porque estão sendo descobertos tantos delitos cometidos que nossa democracia está cada vez mais forte. Hoje ninguém se atreve a defendê-lo. Ele foi um típico ditador corrupto. Já foi condenado pela população.

Qual será a atitude do governo caso Pinochet morra durante a gestão de Bachelet?

ZALDÍVAR: Muitas vezes pensamos isso. Eu mesmo, quando era presidente do Senado, pensei algumas vezes o que faria nesse caso. Sempre houve uma preocupação, mas o que ela disse é que nesse caso cumprirá a lei vigente nesse momento. Mas neste momento não estamos preocupados com isso. Não queremos perder tempo com questões vinculadas a Pinochet.

O governo de Bachelet vai avançar ainda mais no esclarecimento dos crimes cometidos durante a ditadura?

ZALDÍVAR: Queremos chegar até as últimas conseqüências, queremos saber a verdade. Aqui não haverá ponto final. A Justiça deve continuar atuando.

Na reunião de ministros da semana passada foram realizados exercícios de relaxamento e aulas de salsa. Trata-se de um estilo mais feminino de governo?

ZALDÍVAR: Foi uma espécie de retiro com métodos modernos para que as pessoas possam se conhecer melhor. Foi uma jornada de encontro, fizemos algumas terapias grupais, alguns exercícios interessantes. Cada um se apresentou, disse quem era, o que havia feito em sua vida, enfim, foi muito bom para começar o governo com certo conhecimento sobre todos os seus integrantes.

Alguns opositores de Bachelet asseguram que ela é um pouco insegura e tem dificuldade em delegar decisões...

ZALDÍVAR: Não, isso não é verdade. Ela é muito competente, sabe muito bem como funciona o Estado. O que acontece é que ela é muito responsável e quer pensar muito bem suas decisões. Mas não se trata de insegurança ou lentidão, e sim de competência para governar. Ao contrário do que diz a imprensa, nós conversamos muito e todos sabemos respeitar os tempos da nova presidente.

¿As mulheres se sentirão mais fortalecidas, pois serão eliminadas todas as barreiras de discriminação¿