Título: EM ANO ELEITORAL, PALOCCI TAMBÉM MUDA E CEDE A PRESSÕES DO GOVERNO
Autor: Eliane Oliveira e Martha Beck
Fonte: O Globo, 12/03/2006, O País, p. 4

Ministro tem sofrido derrotas, o que preocupa técnicos da área econômica

BRASÍLIA. Há meses o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, vem amargando uma série de derrotas na batalha dos gastos públicos, o que tem preocupado integrantes da equipe econômica. Sofrendo fortes pressões políticas, por causa do ano eleitoral, Palocci nunca cedeu tanto em termos de desoneração de impostos. São exemplos o pacote da construção civil, a medida provisória que virou a chamada Lei do Bem e a MP de benefícios às domésticas.

Essa nova fase de Palocci começou no segundo semestre do ano passado, quando foi duramente bombardeado devido às altas taxas de juros e à rigidez fiscal por um grupo do governo liderado pela ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.

Técnicos da área econômica se queixam do livre acesso que todos os ministros têm ao presidente da República para defender suas propostas e das pressões que crescem a cada dia. A preocupação, dizem nos bastidores, é com a estabilidade econômica alcançada após longo período de arrocho fiscal.

E alertam que os próximos itens da agenda de demandas vão pesar no caixa: os servidores públicos querem uma reserva de R$5,2 bilhões do Orçamento para um plano de reestruturação de salários; os estados reivindicam R$5,2 bilhões para a compensação com as perdas impostas pela Lei Kandir (isenção do ICMS nas exportações de produtos básicos e semi-elaborado); e agricultores do Sul querem negociação de suas dívidas, como o governo já fez com os do Nordeste.

Medidas ainda não estão previstas no Orçamento

As derrotas que o Ministério da Fazenda vem sofrendo na queda de braço com outros ministérios e com o setor produtivo por medidas de desoneração já chegaram ao seu limite, afirma uma fonte da equipe econômica. Ela lembra que o Orçamento de 2006 ainda não foi aprovado e que algumas das medidas anunciadas não estão previstas no texto, como a desoneração das despesas com empregados domésticos, a redução da carga tributária para investidores estrangeiros e a correção de 8% na tabela do Imposto de Renda das Pessoas Físicas.

¿ Não há mais grandes margens. Pelo que já foi feito até agora, ficamos no zero a zero. Mas se essas pressões continuarem, a gente pode acabar perdendo a partida ¿ diz a fonte, alertando para o fato de que, se o equilíbrio fiscal for comprometido, é preciso contingenciar recursos e o custo político fica ainda mais alto.

Quem mais se destacou nas pressões contra a rigorosa política fiscal foi o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Fernando Furlan, que conseguiu várias vitórias como zerar o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) sobre bens de capital. Este ano, mais ministros se uniram a Dilma Rousseff e Furlan. Márcio Fortes de Almeida, das Cidades, encampou a idéia do pacote da construção civil. E Roberto Rodrigues, da Agricultura, tenta convencer a equipe econômica e o presidente Lula a refinanciar dívidas de produtores do Sul que tiveram prejuízos com a estiagem.

Palocci reage a cada demanda levando ao presidente Lula as simulações feitas pela Receita Federal sobre cenários futuros ¿ que traz sempre como advertência o risco de se comprometer o ajuste fiscal do país.

Mercadante diz que rigor fiscal será mantido

O líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), confirma que quase não há mais sobra de caixa para tantas bondades. Ele assegura que o rigor e a austeridade fiscal será mantida, mas admite que, com o aumento da carga tributária, as autoridades brasileiras precisam compensar a sociedade.

¿ Os benefícios, incluindo a queda dos juros, têm de ser vistos com critério social, como é o caso da construção civil, que é um setor que gera empregos. As desonerações precisam ser sempre muito bem dosadas e com cuidado, olhando para o impacto social ¿ diz Mercadante.