Título: MANTER À DISTÂNCIA
Autor:
Fonte: O Globo, 12/03/2006, Opinião, p. 6

Aos políticos se aplica a observação, atribuída a Talleyrand, de que ¿a palavra foi dada ao homem para disfarçar o próprio pensamento¿. Nossos parlamentares não têm pudor de adotar a impostura como instrumento de luta pelo poder, tanto é que pesquisa do Vox Populi, a respeito das instituições brasileiras, mostra que a classe política tem a menor credibilidade.

Segundo a Constituição, ¿todo poder emana do povo e em seu nome será exercido¿. Mas não é o que acontece na realidade, quando os interesses populares são relegados ao segundo plano para que sejam atendidos interesses individuais ou de pequenos grupos. A desfaçatez com que os políticos desempenham a representação que lhes outorgada é notória, se manifestando de inúmeras maneiras execráveis, tais como falta de decoro e de ética, clientelismo, corporativismo e, até mesmo, a investidura no mandato de indivíduos desqualificados.

Verificamos estelionato eleitoral de parte do atual governo, que eleito por combater o neoliberalismo, o adotou com mais fervor do que o governo que o precedeu. Constatamos que a CPI dos Bingos não se limita ao fato determinado para o qual foi criada, mas sim que procura coletar fatos diversos que comprometam o governo.

Não basta apenas esclarecer o povo e evitar que seja manipulado por marqueteiros. Mesmo o eleitor consciente tem sua escolha deturpada pelo sistema político degenerado. Faz-se necessária uma profunda reforma política sem participação dos políticos que, não tendo isenção para conduzi-la, devem abdicar de sua elaboração em favor de representantes da sociedade organizada, qualificados para tratar a questão.

Parodiando uma conhecida expressão, pode-se dizer que política é algo muito sério para ser deixado apenas nas mãos dos políticos ¿ pelo menos no caso dos que há muito pululam no país afora.

ANTONIO LUMBRERAS JÚNIOR é economista.