Título: PREFEITO SE DIZ TRAÍDO PELA CÚPULA TUCANA
Autor: Gerson Camarotti
Fonte: O Globo, 15/03/2006, O País, p. 8

Serra reclama de rompimento de acordo no qual ele seria candidato se estivesse mais bem colocado nas pesquisas

BRASÍLIA. O PSDB vai ter dificuldades para cicatrizar as feridas deixadas no prefeito de São Paulo, José Serra. Ao fim de meses de indefinições e desgastes, Serra desabafou ontem com amigos dizendo que foi traído pela cúpula do partido. Confiou plenamente num acordo que teria sido fechado em dezembro numa reunião dele com o ex-presidente Fernando Henrique, o governador Aécio Neves (MG) e o presidente do PSDB, senador Tasso Jereissati (CE): Serra seria o candidato se tivesse vantagem nas pesquisas.

Mais que isso, o triunvirato pediu a Serra, segundo o relato do prefeito: que ele evitasse o confronto com o governador Geraldo Alckmin e que se mantivesse preservado. Na ocasião, Serra foi alertado pelo próprio Fernando Henrique de que não podia repetir o que tinha feito em 2002, quando ¿tratorou¿ o partido, impôs sua candidatura, tirou Tasso da disputa e acabou sendo abandonado pelo partido. Pelo acordo, não haveria disputa em hipótese alguma.

Foi esse compromisso que Serra esperava ver cumprido. Por isso, segundo os aliados, ele evitou durante os três últimos meses declarar sua candidatura. Achava que se fizesse isso perderia o discurso de que havia sido convocado pelo partido para enfrentar Lula. Na conversa da madrugada de ontem com os três caciques tucanos, Serra cobrou o compromisso assumido em dezembro.

¿ Quero dizer que fiz tudo o que foi acertado em dezembro ¿ teria dito Serra.

A mágoa do prefeito já era sentida pelos que o cercavam na véspera, quando ele resolveu declarar que seria o candidato se não houvesse prévia ou disputa. Já sabia que não poderia ser o candidato de consenso, mas fez questão de expor que o partido não lhe deu condições para abandonar a prefeitura e assumir a disputa com Lula.

¿Acho que o partido errou¿

No telefonema que deu a Tasso Jereissati, quando saiu do encontro com Alckmin na prefeitura, Serra disse:

¿ Estou fora da disputa. Dessa forma não vou. Acho que o partido errou na condução do processo.

Convidado por Tasso para fazer o anúncio oficial do presidenciável tucano, não aceitou:

¿ Não me peça isso. Mas vou apoiar o Alckmin.

Segunda-feira, Serra já dava sinais de que jogaria a toalha. A entrevista dada na porta de sua casa foi uma forma cifrada de lembrar todos os compromissos assumidos pela cúpula tucana. O prefeito tinha a promessa de que não haveria prévia. Segundo aliados, ele ficou imobilizado por causa do acerto. A avaliação do prefeito é de que foi derrotado internamente quando perdeu o apoio de Aécio e Tasso. Também considera que a neutralidade de Fernando Henrique prejudicou sua posição.

Já a cúpula tucana alega que Serra demonstrou insegurança em ser candidato. Com isso, Alckmin acabou ganhando espaço no partido. A maior demonstração foi a enquete feita pelo GLOBO com a bancada tucana no Congresso que já mostrava a preferência de maioria dos deputados e senadores por Alckmin. Durante o carnaval, quando Serra percebeu que a posição de Alckmin já tinha avançado bastante, ele resolveu reagir. Mas já era tarde. Avisou de Buenos Aires a aliados que aceitaria ser o candidato.

Depois confirmou sua disposição a Tasso, num encontro em Jundiaí. Sexta-feira passada, reforçou seu desejo de ser candidato para a cúpula tucana, em São Paulo, e na segunda-feira concedeu a entrevista.