Título: ISRAEL CAPTURA PRESOS PALESTINOS
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Fonte: O Globo, 15/03/2006, O Mundo, p. 32

Tropas invadem prisão em Jericó e levam líder da FPLP. Militantes reagem e seqüestram estrangeiros

JERICÓ, Cisjordânia

Numa operação militar que deixou os territórios palestinos em polvorosa, tropas israelenses cercaram e invadiram uma prisão em Jericó e capturaram o líder da Frente Popular para a Libertação da Palestina (FPLP) e outros cinco militantes detidos no prédio. O cerco durou dez horas e causou protestos violentos em várias cidades palestinas, onde pelo menos nove estrangeiros foram seqüestrados em represália à retirada dos monitores britânicos da prisão pouco antes da invasão. A situação levou o Conselho de Segurança da ONU a realizar uma sessão de emergência.

A operação militar foi deflagrada pela manhã com o apoio de blindados e helicópteros de combate, que bombardearam as paredes externas da prisão para abrir caminho aos tratores e escavadeiras que demoliriam as celas. Na troca de tiros, um guarda palestino e um preso morreram e cerca de uma dezena de detentos ficaram feridos. Pouco depois do anoitecer, o líder da FPLP, Ahmed Saadat, de 51 anos, e outros 200 guardas e prisioneiros se renderam. Antes de se entregar, Saadat havia dito por telefone à rede de TV al-Jazeera que não se renderia.

¿ Nossa escolha é lutar ou morrer ¿ afirmara.

O governo de Israel acusa Saadat de ser o mentor intelectual do assassinato do ministro do Turismo israelense, Rehavam Zeevi, em 2001, e alegou temer que ele fosse libertado quando o grupo radical Hamas assumisse a chefia da Autoridade Nacional Palestina (ANP), como insinuou após vencer as eleições legislativas em janeiro. Na semana passada, o presidente Mahmoud Abbas se disse pronto a fazê-lo. Eleito deputado em janeiro, Saadat estava preso em Jericó desde 2002, como parte do acordo que possibilitou o fim do cerco israelense ao QG do então presidente da ANP, Yasser Arafat, em Ramallah. Outros quatro militantes presos também estariam envolvidos no assassinato de Zeevi e o quinto, numa tentativa de contrabandear armas para os territórios palestinos.

¿ Tudo isso aconteceu devido ao fato de o Hamas ser parte da nova Autoridade Nacional Palestina ¿ justificou Gideon Meir, vice-diretor-geral do Ministério das Relações Exteriores de Israel, acrescentando que os presos serão levados a julgamento.

Abbas culpa EUA e Grã-Bretanha

Por sua vez, o pesquisador Ely Karmon, do Instituto de Antiterrorismo, em Israel, também culpou a ANP por ¿não estar cumprindo suas obrigações¿ e disse que o Hamas poderia libertar Saadat com a intenção de se aproximar da FPLP ¿ da qual é rival ¿ para tê-la como aliada no futuro governo. Nenhuma das duas organizações reconhece o Estado de Israel.

¿ A solução do problema palestino é complexa e envolve elementos sociais, econômicos, psicológicos e também militares. Israel tem de se defender e não pode ficar à mercê do terror ¿ disse ele ao GLOBO em visita ao Rio, onde amanhã fará palestra no Centro Brasileiro de Relações Internacionais.

A ANP rebateu acusando o premier em exercício de Israel, Ehud Olmert, de ordenar a operação como golpe publicitário para reforçar sua imagem nas eleições parlamentares daqui a duas semanas. Abbas encurtou uma visita à Europa para voltar aos territórios. Saeb Erekat, o principal negociador de paz palestino, disse que o ataque foi uma ¿grande provocação¿.

¿ Não consigo nem começar a entender por que Israel desejaria uma guerra total. O ataque militar de hoje (ontem) parece sugerir esse objetivo ¿ criticou.

O presidente Mahmoud Abbas responsabilizou os Estados Unidos e a Grã-Bretanha pelo ataque por retirarem seus observadores da prisão momentos antes. Na semana passada, os dois países advertiram numa carta conjunta à ANP que não manteriam seus homens no local por causa de falhas no sistema de segurança implementado pelos palestinos ¿ os presos teriam trânsito livre e estariam falando por celular de suas celas. Na carta, a ANP foi avisada de que os observadores poderiam ser retirados a qualquer momento. Ontem, meia hora depois de os três monitores britânicos saírem da prisão, começou a operação militar israelense.

¿ Retiramos os monitores porque há meses estamos preocupados com sua segurança. A ANP não estava cumprindo suas obrigações ¿ alegou Micaela Schweitzer-Bluhm, porta-voz do Consulado dos EUA em Jerusalém Oriental.

Em reação à operação, houve protestos de dezenas de milhares de pessoas em cidades palestinas. Na Cidade de Gaza, militantes da FPLP incendiaram o prédio do British Council e atacaram sedes de organizações americanas e de países da União Européia (UE). Em Ramallah, o British Council também foi atacado, assim como uma filial do banco HSBC. À noite, cerca de 200 homens armados invadiram a prisão de Belém e libertaram oito detidos, a maioria integrante das Brigadas dos Mártires de al-Aqsa, vinculadas ao partido Fatah, de Abbas.

Entre nove e 12 estrangeiros foram seqüestrados: foram confirmados quatro franceses, dois australianos, um suíço da Cruz Vermelha, um sul-coreano e um professor universitário americano. A maioria foi libertada até a noite. Vários estrangeiros foram retirados de Gaza e o governo da Grã-Bretanha exortou os cidadãos britânicos a deixarem os territórios. O posto de fronteira entre Gaza e o Egito em Rafah foi fechado após a saída dos monitores europeus.