Título: ARROGÂNCIA
Autor:
Fonte: O Globo, 17/03/2006, Opinião, p. 6

CARVALHO

Oministro Nelson Jobim tingiu com cores sombrias sua inesquecível passagem pela presidência do STF. Daí sua melancólica despedida da Corte e da sua presidência, de que também se afasta sem estimular o rufar dos tambores do tributo de qualquer justificada homenagem.

Recentemente, ao reagir com irritação a críticas que lhe foram dirigidas por sua conduta em julgamento que buscava protelar a votação pela Câmara Federal da perda do mandato do ex-deputado José Dirceu, afirmou o ministro Jobim que ¿os idiotas perderam a modéstia¿.

Essa reação, pela falta de moderação, poderia ser considerada imprópria para um magistrado, cuja altivez e firmeza nunca devem, pela própria natureza de suas funções, prescindir da serenidade. Em se tratando do seu autor, na verdade corresponde ao triste retrospecto de atuação que coloca a mais alta Corte de Justiça do país a serviço de sua biografia e dos propósitos de uma recorrente carreira política, como unissonamente afirmado pela imprensa nacional.

Já em seu discurso de posse na presidência do STF, afirmara, impropriamente, o intento de parceria com o poder executivo. A obsessão pela governabilidade não pode turvar a visão do Judiciário no tocante a seus primordiais deveres de tornar efetiva a supremacia da Constituição e a aplicação da Justiça.

Se, como afirmou o ministro, os idiotas perderam a modéstia, certamente a Nação, já tão castigada pela temporada de escabrosa corrupção em sucessão de escândalos no Executivo e no Legislativo, também não aceita a afronta de um eventual exercício de autocrítica nem da perda do pudor pela arrogância.

THIAGO RIBAS FILHO é desembargador aposentado e ex-presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro

LUIZ FERNANDO RIBEIRO DE CARVALHO é desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro