Título: Independência
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Fonte: O Globo, 17/03/2006, Opinião, p. 6

Indicado para o Supremo pelo presidente Fernando Henrique Cardoso, o advogado e ex-parlamentar pelo PMDB Nelson Jobim nunca escondeu a vocação política. Mas seria uma impropriedade levantar suspeições sobre a atuação de Jobim na Corte, da qual se despedirá no fim do mês como presidente, substituído no cargo pela ministra Ellen Gracie.

Ao decidir voltar à militância político-partidária, para isso abrindo mão de uma carreira no STF, Jobim, no entanto, colocou em discussão o sistema de indicação dos magistrados da mais alta instância do Poder Judiciário.

Houve uma movimentação de corporações da magistratura interessadas em reservar as cortes supremas para juízes. A proposta é inadequada por ir contra a necessidade de, mantida sua imprescindível independência, tornar-se a Justiça parte efetiva do Estado brasileiro, deixando de ser uma instituição autônoma, refratária à sociedade, controlada por castas. Por isso, a reforma do Judiciário criou o Conselho Nacional de Justiça.

O método de nomeação dos ministros do Supremo, idêntico ao adotado nos Estados Unidos, é eficiente. Cabe ao presidente da República encaminhar nomes a serem examinados pelo Senado. Há portanto um filtro capaz de corrigir equívocos presidenciais.

Algum aperfeiçoamento pode ser feito. A Associação dos Magistrados do Brasil, a AMB, defende a criação de uma quarentena para juízes que desejam ingressar na vida política. Faz sentido a proposta, já em tramitação no Congresso, numa emenda constitucional.

Mas o ideal seria não se permitir a nomeação para os tribunais de políticos em atividade. A política e a Justiça são esferas que devem ser mantidas distantes uma da outra. Quando se aproximam, a credibilidade do Poder Judiciário é atingida, independentemente da lisura do magistrado em questão. O caso de Nelson Jobim é um exemplo: logo que seus planos de voltar à política partidária foram conhecidos, decisões suas no Supremo passaram a ser questionadas em meio aos embates entre oposição e situação. A Justiça foi envolvida por choques e conflitos, sobre os quais precisa pairar, e não ser parte deles.