Título: DÓLAR A CAMINHO DOS R$ 2
Autor: Patricia Eloy, Wagner Gomes e Gerson Camarotti
Fonte: O Globo, 17/03/2006, Economia, p. 21

Moeda americana chega a R$2,11, a menor cotação desde 20 de março de 2001

Osucesso da captação de recursos feita ontem pelo Brasil no exterior, a divulgação da ata do Comitê de Política Monetária (Copom) indicando queda gradual dos juros básicos e a inflação mais baixa nos Estados Unidos contribuíram ontem para o dólar fechar com a menor cotação desde 20 de março de 2001. Na sexta queda consecutiva, a moeda americana fechou a R$2,11 para venda (-0,52%).

Na mínima do dia, o dólar chegou a ser vendido a R$2,10 e só não caiu abaixo deste patamar porque o Banco Central (BC) voltou a comprar dólares no mercado à vista por R$2,105. Desde a semana passada, o BC não realiza o leilão de swap cambial reverso, operação que acontecia diariamente desde novembro de 2005 e equivale a uma compra de dólares no mercado futuro.

Analistas não acreditam que o BC retome os leilões de swap e, com isso, estimam que o dólar pode chegar aos R$2. Segundo Alexandre Póvoa, diretor da Modal Asset Management, os swaps perderam a função:

¿ O BC interrompeu os leilões quando conseguiu zerar as dívidas interna e externa em dólares, no total de US$81 bilhões, no início do mês. Agora, faz sentido apenas manter a intervenção à vista, que ajuda a engordar as reservas cambiais. Mesmo assim, o dólar deve seguir numa trajetória de baixa pois há cerca de US$20 bilhões em dólares excedentes no mercado, o dobro do ano passado. Com tanto dinheiro ao redor, o dólar deve chegar aos R$2 até o fim de abril ¿ acredita Póvoa.

Francisco Eduardo Pires de Souza, professor do Instituto de Economia da UFRJ, acredita que apenas os leilões à vista serão ineficazes para conter a valorização do real. Ele avalia que, diante dos juros elevados ¿ a Taxa Selic está hoje em 16,5% ao ano ¿ os recursos de estrangeiros continuarão entrando no país, empurrando a cotação do dólar para baixo.

¿ A solução para o câmbio está nos juros e, enquanto esse problema não for solucionado, a tendência será de queda. Se o BC continuar apenas com os leilões à vista, o dólar poderá chegar facilmente aos R$2.

Indicação de juros a 15% em junho

Mas o cenário traçado pela equipe econômica ao Palácio do Planalto para a política monetária nos próximos meses prevê que em 90 dias a taxa básica de juros vai atingir o patamar mais baixo na história do país. A expectativa é que, mantidas as condições dos principais indicadores econômicos, a Selic chegue a 15% anuais em junho. O menor nível de juros até agora registrado foi de 15,25%, que vigoraram entre janeiro e março de 2001.

Ontem pela manhã, numa reunião com ministros que integram a cúpula do governo, o titular da Fazenda, Antonio Palocci, comunicou aos seus colegas claramente que a taxa de juros continuará caindo de forma consistente. A avaliação de Palocci reforçou a ata da reunião de março do Copom, divulgada ontem, que defendeu a manutenção da política de redução gradual dos juros.

Segundo um integrante da equipe econômica, o que o BC quis dizer na ata é que se mantiver um ritmo moderado de queda da Selic ¿ cortes de 0,75 ponto percentual em abril e junho ¿ terá menos chances de errar na calibragem dos juros e poderá reduzi-los por um prazo mais longo. A calibragem permitirá chegar a uma taxa de juros de equilíbrio ¿ que permite expansão da economia vigorosa sem pressão sobre os preços ¿ inferior aos 15%.

Por esta análise, a cautela do BC em baixar os juros em apenas 0,75 ponto percentual, sob críticas de que lhe falta ousadia, justifica-se pelo fato de evitar que a ¿taxa de equilíbrio¿ seja ultrapassada e provoque um surto inflacionário. Isso faria com que o cinto fosse novamente apertado, impedindo que o país testasse sua capacidade de conviver com juros cada vez mais baixos.

A equipe econômica argumenta que esse processo permitirá que a Selic caia de forma consistente, o que nunca foi feito no Brasil. Um histórico feito ontem por este integrante da equipe econômica mostrou que, no segundo mandato de Fernando Henrique, a taxa de equilíbrio era 16,5%, mas este limite foi ultrapassado, e rapidamente. O Copom, então, foi obrigado a subir a Selic devido ao repique da inflação. No governo Lula, a taxa de equilíbrio foi de 17,5% em 2004.

¿ Pela primeira vez estamos testando a taxa de equilíbrio abaixo da marca de 16,5% alcançada na gestão anterior. Acho que podemos avançar, ir além. Mas, para fazer isso, é preciso cautela. Caso contrário, podemos errar. Estamos fazendo uma espécie de pouso suave. Dessa forma teremos mais resultado ¿ avalia a fonte.

A equipe econômica, neste contexto, não está preocupada com as pressões de setores políticos e empresariais. A maior preocupação do Copom, neste caso, é com a credibilidade do sistema de metas da inflação. A confiança de empresários de que a inflação chegará ao alvo de 4,5% de 2006 é o combustível para que o BC chegue à nova taxa de equilíbrio, avalia esta fonte.

(*) Do Globo Online