Título: `O GOVERNO PARECE TER MUITO A ESCONDER¿
Autor: Flávio Freire
Fonte: O Globo, 19/03/2006, O País, p. 3

Alckmin critica PT por recorrer à Justiça para impedir investigações da CPI dos Bingos

Em entrevista que só acabou no fim da noite de sexta-feira, no Palácio dos Bandeirantes, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, candidato do PSDB à Presidência da República, citou uma frase do ex-presidente argentino Juan Perón para explicar seu cuidado com as palavras: ¿Fale muito das coisas, pouco das pessoas e nada de você¿. É assim que ele pretende se mostrar ao eleitorado. Discreto, Alckmin não reage a provocações mas mostra uma ponta de irritação com a pecha de conservador. O governador criticou a decisão do presidente Lula de recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar impedir as investigações da CPI dos Bingos: ¿Parece que o governo tem muito a esconder¿.

O senhor acredita que a cúpula do PSDB subestimou seu interesse em ser o candidato do partido à Presidência da República?

GERALDO ALCKMIN: Na realidade, sempre busquei o entendimento e o presidente Tasso Jereissati teve muita habilidade na condução do processo, apoiado pelo presidente Fernando Henrique Cardoso e o governador Aécio Neves. O importante é que não houve disputa e ficamos unidos.

Não ficou evidente uma disputa individual por poder?

ALCKMIN: Não concordo. Primeiro, quero homenagear o prefeito José Serra, um dos homens públicos mais preparados do país, por seu desprendimento e espírito público. Não houve divergência conceitual, falamos o mesmo idioma, trilhamos o mesmo caminho. O que tem é diferença de estilo.

Por que o senhor e não José Serra, se ele é o preferido da opinião pública, pelas pesquisas?

ALCKMIN: Não é nem melhor nem pior, é uma decisão política. Me sinto preparado e completei uma boa missão. Aprendi administração aos 23 anos de idade como prefeito e fui co-piloto do Mário Covas. E pesquisa de voto não me pressiona.

José Serra deve ser submetido a prévias caso decida se lançar ao governo de São Paulo?

ALCKMIN: Se tivermos um entendimento, não será preciso disputa. O Serra é um candidato excepcional.

Excepcional para São Paulo e não para a Presidência.

ALCKMIN: Se ele tivesse sido escolhido, teria meu apoio.

O PFL é o noivo perfeito?

ALCKMIN: O PFL vai se definir até o fim deste mês. O partido já lançou o prefeito Cesar Maia, um bom quadro. Mas se não decidirem ter um candidato, trabalharemos pela aliança.

É possível atrair partidos para um arco de alianças ainda sem respaldo do eleitor, como apontam as pesquisas?

ALCKMIN: Não há eleição fácil e é bom que seja assim. Em eleição disputada quem ganha é o eleitor. Eu confio na mudança e estou até surpreso. Imaginava começar o horário eleitoral, em agosto, com um dígito, 8%, 9%. Ter 20% e ainda ser pouco conhecido do eleitor é um piso alto.

Mas isso não intimida os partidos?

ALCKMIN: Entendo que as possibilidades da nossa candidatura são muito boas. Temos grande chance de ir ao segundo turno. Ainda vou crescer. Não é possível um governo e um partido do governo tão envolvidos com mentira. O povo está desencantado. Há um abismo entre falar e fazer. Sob o ponto de vista ético, todo dia tem uma medida judicial para evitar a verdade, impedir a apuração de fatos graves. É assustador. Parece que há muito o que se esconder para tentar evitar a verdade. Não é possível ir à Justiça para não se apurar caixa-dois, dólares de Cuba, crime de Santo André.

Na sua opinião, o presidente Lula está por trás desses escândalos envolvendo gente do governo?

ALCKMIN: É impossível o presidente da República não ter conhecimento dessas coisas. É evidente que o chefe de governo é responsável e tem que ter conhecimento dos fatos que ocorrem.

A questão da ética vai fazer diferença nessa eleição?

ALCKMIN: Entendo que a questão da ética não vai eleger ninguém, mas ela exclui.