Título: VALÉRIO FOI PONTE PARA DIRCEU, DIZ KÁTIA RABELLO
Autor: Gerson Camarotti
Fonte: O Globo, 19/03/2006, O País, p. 13

Para comissão, depoimento da presidente do Rural é peça-chave para confirmar lobby

BRASÍLIA. A cúpula petista encontrou, ainda em 2003, uma forma para defender o lobby no Banco Central e com isso ajudar o negócio pretendido por Marcos Valério. O empresário mineiro tentou pegar carona no prestígio do ex-banqueiro Armando Monteiro Filho, do Mercantil. Amigo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Monteiro Filho tentava resgatar, junto ao governo, os lucros da massa falida do Mercantil de Pernambuco.

Como o banco tinha títulos públicos cotados em dólar, esses papéis passaram a ser lucrativos com a desvalorização do real em 1999. Monteiro Filho percorreu gabinetes do Senado, do BC e até mesmo o gabinete de Lula, no Palácio do Planalto.

¿ O que Armando Monteiro Filho fez foi uma defesa clara dos direitos dele. Tanto que colocou a causa na Justiça. Agora, não temos nada a ver com a pressão subterrânea feita pelo pessoal de Minas. Se tentaram usar o prestígio de Armando, foi sem autorização. Não temos nada com eles. Valério pode ter se aproveitado da nossa causa para tentar fazer negócio ¿ diz o deputado Armando Monteiro Neto, presidente da CNI e filho do ex-banqueiro.

BC registrou 17 visitas de Marcos Valério

Para a CPI, a história do lobby se fecha com o depoimento da presidente do Banco Rural, Kátia Rabello, que afirmou que teve reuniões com Dirceu para discutir a liquidação do Mercantil de Pernambuco. Ela confirmou dois encontros: um no Planalto e outro num hotel de Belo Horizonte. Ela contou que Valério era uma espécie de facilitador para conseguir os encontros com o ex-chefe da Casa Civil.

No início do governo Lula, ainda sem muita influência, Valério usou o prestígio do deputado Virgílio Guimarães (PT-MG) para conseguir o contato com o BC. Nesse encontro, Virgílio levou Valério e o então vice-presidente do Rural, José Augusto Dumont, já falecido.

¿ No início de 2003, levei Valério ao BC com o Dumont. Eles tentavam comprar a massa falida do Banco Mercantil. Falaram que era um negócio legítimo. Mas depois, conseguiram pessoas mais influentes para tratar junto ao BC ¿ conta Virgílio.

Documentos em poder da CPI entregues pelo próprio BC registram 17 visitas de Valério à instituição: 13 em Brasília e quatro em São Paulo para encontros com os diretores Gustavo Vale (Liquidações) e Paulo Sérgio Cavalheiro (Fiscalizações). O documento explica que algumas dessas reuniões, apesar de agendadas, não foram realizadas.

¿O assunto que motivou a maioria das audiências foi o interesse do Banco Rural no levantamento da liquidação extrajudicial do Banco Mercantil de Pernambuco¿, afirma o texto produzido pela sub-relatoria de movimentação financeira, da CPI. Acrescenta que Valério demonstrou também interesse, pelo menos uma vez, na liquidação do Banco Econômico.

Dirceu nega pressão da Casa Civil sobre Banco Central

Num ofício assinado pelos diretores Cavalheiro e Vale, o BC informa que explicou a Valério ¿que um processo de levantamento de liquidação extrajudicial é um ato complexo que depende de análises técnicas e jurídicas¿.

Procurado pelo GLOBO, Dirceu confirma o encontro com Kátia Rabello, mas nega que tenha feito pressão junto ao BC para a solução do caso.

¿ Nunca houve pressão da Casa Civil sobre o BC. Nunca tratei desse assunto com ninguém do governo. A Kátia Rabello me relatou o pleito do Rural, mas eu ouvi calado. Não há nada contra mim. Fui cassado por razões políticas ¿ disse José Dirceu.

Em nota, o Banco Rural afirma que desde 1999 ¿vem manifestando seu interesse em adquirir o controle acionário da massa em liquidação do Banco Mercantil¿, tendo, neste período, apresentado formalmente várias propostas ao BC. O Rural já detém 22% do Mercantil.

O advogado de Valério, Marcelo Leonardo, diz que seu cliente fez uma consultoria particular e legítima para o Rural